Na
madrugada do dia 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado contra o
governo legalmente constituído de João Goulart. A falta de reação do governo e
dos grupos que lhe davam apoio foi notável. Não se conseguiu articular os
militares legalistas.
Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976.
Também fracassou uma greve geral proposta pelo Comando Geral dos Trabalhadores (CGT) em apoio ao governo. João Goulart, em busca de segurança, viajou no dia 1o de abril do Rio, para Brasília, e em seguida para Porto Alegre, onde Leonel Brizola tentava organizar a resistência com apoio de oficiais legalistas, a exemplo do que ocorrera em 1961. Apesar da insistência de Brizola, Jango desistiu de um confronto militar com os golpistas e seguiu para o exílio no Uruguai, de onde só retornaria ao Brasil para ser sepultado, em 1976.
Presidente
João Goulart, em algum momento durante o seu governo, transmite,
temporariamente, o cargo de presidente para Ranieri Mazzili, presidente da Câmara
dos Deputados (s/d). Antes mesmo de Jango deixar o país, o presidente do
Senado, Auro de Moura Andrade, já havia declarado vaga a presidência da
República. O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, assumiu
interinamente a presidência, conforme previsto na Constituição de 1946, e como
já ocorrera em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros. O poder real, no
entanto, encontrava-se em mãos militares. No dia 2 de abril, foi organizado o
autodenominado "Comando Supremo da Revolução", composto por três
membros: o brigadeiro Francisco de Assis Correia de Melo (Aeronáutica), o
vice-almirante Augusto Rademaker (Marinha) e o general Artur da Costa e Silva,
representante do Exército e homem-forte do triunvirato. Essa junta permaneceria
no poder por duas semanas.
Nos
primeiros dias após o golpe, uma violenta repressão atingiu os setores
politicamente mais mobilizados à esquerda no espectro político, como por
exemplo o CGT, a União Nacional dos Estudantes (UNE), as Ligas Camponesas e
grupos católicos como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular
(AP). Milhares de pessoas foram presas de modo irregular, e a ocorrência de
casos de tortura foi comum, especialmente no Nordeste. O líder comunista
Gregório Bezerra, por exemplo, foi amarrado e arrastado pelas ruas de Recife.
A
junta militar baixou um "Ato Institucional" – uma invenção do governo militar
que não estava prevista na Constituição de 1946 nem possuía fundamentação jurídica.
Seu objetivo era justificar os atos de exceção que se seguiram. Ao longo do mês
de abril de 1964 foram abertos centenas de Inquéritos Policiais-Militares
(IPMs). Chefiados em sua maioria por coronéis, esses inquéritos tinham o
objetivo de apurar atividades consideradas subversivas. Milhares de pessoas
foram atingidas em seus direitos: parlamentares tiveram seus mandatos cassados,
cidadãos tiveram seus direitos políticos suspensos e funcionários públicos
civis e militares foram demitidos ou aposentados. Entre os cassados,
encontravam-se personagens que ocuparam posições de destaque na vida política
nacional, como João Goulart, Jânio Quadros, Miguel Arraes, Leonel Brizola e
Luís Carlos Prestes.
Entretanto, o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade
brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários
rurais, Carlos Lacerda e Cordeiro de Farias (1955) da Igreja católica, vários
governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara,
Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos
setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma
de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise
econômica. Antônio Carlos Muricy, Magalhães Pinto e Aurélio Lira Tavares numa
cerimônia de condecoração do primeiro (entre 1967 e 1969). O golpe também foi
recebido com alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de ver que o
Brasil não seguia o mesmo caminho de Cuba, onde a guerrilha liderada por Fidel
Castro havia conseguido tomar o poder. Os Estados Unidos acompanharam de perto
a conspiração e o desenrolar dos acontecimentos, principalmente através de seu
embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e
haviam decidido, através da secreta "Operação Brother Sam", dar apoio
logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma longa
resistência por parte de forças leais a Jango.
Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação
afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças
Armadas e deter a "ameaça comunista" que, segundo eles, pairava sobre
o Brasil. Uma ideia fundamental para os golpistas era que a principal ameaça à
ordem capitalista e à segurança do país não viria de fora, através de uma
guerra tradicional contra exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do
próprio país, através de brasileiros que atuariam como "inimigos
internos" – para usar uma expressão da época. Esses "inimigos
internos" procurariam implantar o comunismo no país pela via
revolucionária, através da "subversão" da ordem existente – daí serem
chamados pelos militares de "subversivos". Diversos exemplos
internacionais, como as guerras revolucionárias ocorridas na Ásia, na África e
principalmente em Cuba, serviam para reforçar esses temores. Essa visão de mundo
estava na base da chamada "Doutrina de Segurança Nacional" e das
teorias de "guerra anti-subversiva" ou
"anti-revolucionária" ensinadas nas escolas superiores das Forças
Armadas.
Os
militares que assumiram o poder em 1964 acreditavam que o regime democrático
que vigorara no Brasil desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia se mostrado
incapaz de deter a "ameaça comunista". Com o golpe, deu-se início à
implantação de um regime político marcado pelo "autoritarismo", isto
é, um regime político que privilegiava a autoridade do Estado em relação às
liberdades individuais, e o Poder Executivo em detrimento dos poderes
Legislativo e Judiciário.
Já no início da "Revolução"
ficou evidente uma característica que permaneceria durante todo o regime
militar: o empenho em preservar a unidade por parte dos militares no poder,
apesar da existência de conflitos internos nem sempre bem resolvidos. O medo de
uma "volta ao passado" (isto é, à realidade política pré-golpe) ou de
uma ruptura no interior das Forcas Armadas estaria presente durante os 21 anos
em que a instituição militar permaneceu no controle do poder político no
Brasil. Mesmo desunidos internamente em muitos momentos, os militares
demonstrariam um considerável grau de união sempre que vislumbravam alguma
ameaça "externa" à "Revolução", vinda da oposição política.
A falta de resistência ao golpe de 1964 não deve ser vista como
resultado da derrota diante de uma bem articulada conspiração militar. Foi
clara a falta de organização e coordenação entre os militares golpistas. Mais
do que uma conspiração única, centralizada e estruturada, a imagem mais
fidedigna é a de "ilhas de conspiração", com grupos unidos
ideologicamente pela rejeição da política pré-1964, mas com baixo grau de
articulação entre si. Não havia um projeto de governo bem definido, além da necessidade
de se fazer uma "limpeza" nas instituições e recuperar a economia. O
que diferenciava os militares golpistas era a avaliação da profundidade
necessária à intervenção militar.
Desde o início havia uma
nítida diferenciação entre, de um lado, militares que clamavam por medidas mais
radicais contra a "subversão" e apoiavam uma permanência dos
militares no poder por um longo período e, de outro lado, aqueles que se
filiavam à tradição de intervenções militares "moderadoras" na
política – como havia acontecido, por exemplo, em 1930, 1945 e 1954 – seguidas
de um rápido retorno do poder aos civis. Os mais radicais aglutinaram-se em
torno do general Costa e Silva; os outros, do general Humberto de Alencar
Castelo Branco.
Articulações bem-sucedidas na área militar de um grupo de
oficiais pró-Castelo e o apoio dos principais líderes políticos civis
favoráveis ao golpe foram decisivos para que, no dia 15 de abril de 1964,
Castelo Branco assumisse a presidência da República, eleito, dias antes, por um
Congresso já bastante expurgado. O novo presidente assumiu o poder prometendo a
retomada do crescimento econômico e o retorno do país à "normalidade
democrática". Isto, no entanto, só ocorreria 21 anos mais tarde. É por
isso que 1964 representa um marco e uma novidade na história política do
Brasil: diferentemente do que ocorreu em outras ocasiões, desta vez militares
não apenas deram um golpe de Estado, como permaneceram no poder.