Florestan
Fernandes (São Paulo, 22 de julho de 1920 — São Paulo, 10 de agosto de 1995)
foi um sociólogo e político brasileiro. Foi deputado federal pelo Partido dos
Trabalhadores.
Segundo
seus relatos, Florestan Fernandes teve, ainda criança, o interesse pelos
estudos despertado, principalmente pela diversidade dos lugares onde passou sua
infância. Afilhado de Hermínia Bresser de Lima, filha de Carlos Augusto
Bresser, Florestan aprendeu com ela a dedicação aos estudos: "O fato é que
embora eu não estudasse organizadamente, pelo fato de ter nascido na casa de
dona Hermínia Bresser de Lima aprendi o que era livro, a importância de estudar
e com pouco mais de seis anos adquiri uma disciplina." Filho de mãe
solteira, não conheceu o pai. O avô materno trabalhou como colono numa fazenda
no interior de São Paulo, morreu de tuberculose e a mãe, após se mudar para a
capital paulista, trabalhou como empregada doméstica. Ganhou o nome do
motorista de sua madrinha (que era alemão), amigo de sua mãe. Começou a
trabalhar, como auxiliar numa barbearia, aos seis anos de idade. Também foi
engraxate. Viveu entre a "grande casa" de sua madrinha, na esquina
entre as ruas Bresser e Celso Garcia e cortiços, em diversos pontos da cidade.
Estudou até o terceiro ano do primeiro grau. Só mais tarde, voltaria a estudar,
fazendo curso de madureza, estimulado por frequentadores do bar Bidu, no centro
de São Paulo, onde trabalhava como garçom.
Em
1941, Florestan ingressou na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
da Universidade de São Paulo, formando-se em ciências sociais. Iniciou sua
carreira docente em 1945, como assistente do professor Fernando de Azevedo, na
cadeira de Sociologia II. Na Escola Livre de Sociologia e Política, obteve o
título de mestre com a dissertação "A organização social dos
Tupinambá". Em 1951 defendeu, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da USP, a tese de doutoramento "A função social da guerra na
sociedade tupinambá", posteriormente consagrado como clássico da etnologia
brasileira, que explora o método funcionalista.
Uma
linha de trabalho característica de Florestan nos anos 50 foi o estudo das
perspectivas teórico-metodológicas da sociologia. Seus ensaios mais importantes
acerca da fundamentação da sociologia como ciência foram, posteriormente,
reunidos no livro "Fundamentos empíricos da explicação sociológica". Seu
comprometimento intelectual com o desenvolvimento da ciência no Brasil,
entendido como requisito básico para a inserção do país na civilização moderna,
científica e tecnológica, situa sua atuação na Campanha de Defesa da Escola
Pública, em prol do ensino público, laico e gratuito enquanto direito
fundamental do cidadão do mundo moderno.
Em
1960, juntamente com outros intelectuais brasileiros, participa da criação da
União Cultural Brasil-União Soviética, atual União Cultural pela Amizade dos
Povos.
Carreira
Durante
o período, foi assistente catedrático, livre docente e professor titular na
cadeira de Sociologia, substituindo o sociólogo e professor francês Roger
Bastide em caráter interino até 1964, ano em que se efetivou na cátedra, com a
tese "A integração do negro na sociedade de classes". Como o título
da obra permite entrever, o período caracteriza-se pelo estudo da inserção da
sociedade nacional na civilização moderna, em um programa de pesquisa voltado
para o desenvolvimento de uma sociologia brasileira.
Nesse
âmbito, orientou dezenas de dissertações e teses acerca dos processos de
industrialização e mudança social no país e teorizou os dilemas do
subdesenvolvimento capitalista. Inicialmente no bojo dos debates em torno das
reformas de base e, posteriormente, após o golpe de Estado, nos termos da
reforma universitária coordenada pelos militares, produziu diagnósticos
substanciais sobre a situação educacional e a questão da universidade pública,
identificando os obstáculos históricos e sociais ao desenvolvimento da ciência
e da cultura na sociedade brasileira inserida na periferia do capitalismo
monopolista.
Aposentado
compulsoriamente pela ditadura militar em 1969, foi Visiting Scholar na
Universidade de Columbia, professor titular na Universidade de Toronto e
Visiting Professor na Universidade de Yale e, a partir de 1978, professor na
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Em 1975, veio a público a obra
"A revolução burguesa no Brasil", que renova radicalmente concepções
tradicionais e contemporâneas da burguesia e do desenvolvimento do capitalismo
no país, em uma análise tecida com diferentes perspectivas teóricas da
sociologia, que faz dialogar problemas formulados em tom Max Weber com
interpretações alinhadas à dialética marxista. No inicio de 1979, retornou a
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, agora reformada, para um curso
de férias sobre a experiência socialista em Cuba, a convite dos estudantes do
Centro Acadêmico de Ciências Sociais. Em suas análises sobre o socialismo,
apropriou-se de variadas perspectivas do marxismo clássico e moderno, forjando
uma concepção teórico-prática que se diferencia a um só tempo do dogmatismo
teórico e da prática de concessões da esquerda. Em 1986 foi eleito deputado
constituinte pelo Partido dos Trabalhadores, tendo atuação destacada em
discussões nos debates sobre a educação pública e gratuita. Em 1990, foi
reeleito para a Câmara. Tendo colaborado com a Folha de S. Paulo desde a década
de 1940, passou, em junho de 1989, a ter uma coluna semanal nesse jornal.
O
nome de Florestan Fernandes está obrigatoriamente associado à pesquisa sociológica
no Brasil e na América Latina. Sociólogo e professor universitário, com mais de
cinquenta obras publicadas, ele transformou o pensamento social no país e
estabeleceu um novo estilo de investigação sociológica, marcado pelo rigor
analítico e crítico, e um novo padrão de atuação intelectual.
O
ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que foi orientado em seus
trabalhos acadêmicos por Florestan, estabeleceu com ele forte relação afetiva,
mantida até a morte do sociólogo.
Florestan,
com graves problemas no fígado, em 1995, submeteu-se a um transplante de fígado
mal sucedido no Hospital das Clínicas de São Paulo, realizado pelo professor
Silvano Raia. Porém morreu de problemas em uma diálise devido à falha humana.
Principais obras
Florestan
começou a escrever no final dos anos 40, e ao longo de sua vida, publicou mais
de 50 livros e centenas de artigos. Suas principais obras foram:
·
Organização
social dos Tupinambá (1949);
·
A
função social da guerra na sociedade Tupinambá (1952);
·
A
etnologia e a sociologia no Brasil (1958) (resenhas e questionamentos sobre a
produção das Ciências Sociais no Brasil, até os anos 50);
·
Fundamentos
empíricos da explicação sociológica (1959);
·
Mudanças
sociais no Brasil (1960) (nesta obra Florestan faz um panorama de seu trabalho
e retrata o Brasil);
·
Folclore
e mudança social na cidade de São Paulo (1961) (esta obra reúne trabalhos e
pesquisas realizadas nos anos em que Florestan foi aluno de Roger Bastide na
USP, dedicados a várias manifestações de cultura popular entre crianças da
cidade de São Paulo).
·
A
integração do negro na sociedade de classes (1964) (estudo das relações raciais
no Brasil);
·
Sociedade
de classes e subdesenvolvimento (1968);
·
Capitalismo
dependente e Classes Sociais na América Latina (1973);
·
A
investigação etnológica no Brasil e outros ensaios (1975) (reedição em volume
de artigos anteriormente publicados em revisas científicas e dedicados à
produção recente da antropologia brasileira);
·
A
revolução burguesa no Brasil: Ensaio de Interpretação Sociológica (1975);
·
Da
Guerrilha ao Socialismo: A Revolução Cubana (1979);
·
O
que é Revolução (1981);
·
Poder
e Contrapoder na América Latina (1981).