A
Idade Média é um período da história da Europa entre os séculos
V e XV. Inicia-se com a Queda do Império Romano do Ocidente e termina durante a
transição para a Idade Moderna. A Idade Média é o período intermédio da divisão
clássica da História ocidental em três períodos: a Antiguidade, Idade Média e
Idade Moderna, sendo frequentemente dividido em Alta e Baixa Idade Média.
Durante
a Alta Idade Média verifica-se a continuidade dos processos de despovoamento,
regressão urbana, e invasões bárbaras iniciadas durante a Antiguidade Tardia.
Os ocupantes bárbaros formam novos reinos, apoiando-se na estrutura do Império
Romano do Ocidente. No século VII, o Norte de África e o Médio Oriente, que
tinham sido parte do Império Romano do Oriente tornam-se territórios islâmicos
depois da sua conquista pelos sucessores de Maomé. O Império Bizantino
sobrevive e torna-se uma grande potência. No Ocidente, embora tenha havido
alterações significativas nas estruturas políticas e sociais, a ruptura com a
Antiguidade não foi completa e a maior parte dos novos reinos incorporaram o
maior número possível de instituições romanas pré-existentes. O cristianismo
disseminou-se pela Europa ocidental e assistiu-se a um surto de edificação de
novos espaços monásticos. Durante os séculos VII e VIII, os Francos, governados
pela dinastia carolíngia, estabeleceram um império que dominou grande parte da
Europa ocidental até ao século IX, quando se desmoronaria perante as investidas
de Vikings do norte, Magiares de leste e Sarracenos do sul.
Durante
a Baixa Idade Média, que teve início depois do ano 1000, verifica-se na Europa
um crescimento demográfico muito acentuado e um renascimento do comércio, à
medida que inovações técnicas e agrícolas permitem uma maior produtividade de
solos e colheitas. É durante este período que se iniciam e consolidam as duas
estruturas sociais que dominam a Europa até ao Renascimento: o senhorialismo –
a organização de camponeses em aldeias que pagam renda e prestam vassalagem a
um nobre – e o feudalismo — uma estrutura política em que cavaleiros e outros
nobres de estatuto inferior prestam serviço militar aos seus senhores,
recebendo como compensação uma propriedade senhorial e o direito a cobrar
impostos em determinado território. As Cruzadas, anunciadas pela primeira vez
em 1095, representam a tentativa da cristandade em recuperar dos muçulmanos o
domínio sobre a Terra Santa, tendo chegado a estabelecer alguns estados
cristãos no Médio Oriente. A vida cultural foi dominada pela escolástica, uma
filosofia que procurou unir a fé à razão, e pela fundação das primeiras
universidades. A obra de Tomás de Aquino, a pintura de Giotto, a poesia de
Dante e Chaucer, as viagens de Marco Polo e a edificação das imponentes
catedrais góticas estão entre as mais destacadas façanhas deste período.
Os
dois últimos séculos da Baixa Idade Média ficaram marcados por várias guerras,
adversidades e catástrofes. A população foi dizimada por sucessivas carestias e
pestes; só a peste negra foi responsável pela morte de um terço da população
europeia entre 1347 e 1350. O Grande Cisma do Ocidente no seio da Igreja teve
consequências profundas na sociedade e foi um dos fatores que esteve na origem
de inúmeras guerras entre estados. Assistiu-se também a diversas guerras civis
e revoltas populares dentro dos próprios reinos. O progresso cultural e
tecnológico transformou por completo a sociedade europeia, concluindo a Idade
Média e dando início à Idade Moderna.
Início e fim da Idade Média
A
data consensual para o início da Idade Média é 476, definida pela primeira vez
por Bruni, e que representa o ano em que é deposto o último imperador romano do
Ocidente. No contexto europeu, considera-se normalmente o fim da Idade Média no
ano 1500, embora não haja um consenso universal alargado sobre a data.
Dependendo do contexto, podem ser considerados como eventos de transição a
primeira viagem de Cristóvão Colombo às Américas em 1492, a conquista de
Constantinopla pelos Turcos em 1453, ou a Reforma Protestante em 1517. Por
outro lado, os historiadores ingleses normalmente referem-se à batalha de
Bosworth em 1485 como referência para o fim do período. Na Espanha, é comum o
recurso ao ano de 1516, aquando a morte do rei Fernando II de Aragão, ou o ano
da morte da rainha Isabel I de Castela em 1504, ou ainda a conquista de Granada
em 1492.
Os
historiadores de línguas românicas tendem a dividir a Idade Média em duas
partes: um primeiro período, a Alta Idade Média e um segundo período, a Baixa
Idade Média. Os historiadores anglo-saxônicos dividem normalmente a Idade Média
em três segmentos: "Early Middle Ages", ou "idade média
arcaica", definido entre 476 e o ano 1000; "High Middle Ages",
ou "alta idade média", entre o ano 1000 e 1300; e "Late Middle
Ages" ou "Idade média tardia" entre 1300 e 1453. Os termos foram
popularizados durante o início do século XX pelo historiador belga Henri
Pirenne e pelo holandês Johan Huizinga. Durante todo o século XIX, a Idade
Média era frequentemente referida como a "Idade das trevas", mas com
a criação de subdivisões o uso do termo ficou restrito ao período arcaico.
Alta Idade Média
A
estrutura política da Europa Ocidental alterou-se significativamente com o fim
da união do Império Romano. Embora as atividades dos povos bárbaros sejam
frequentemente descritas como "invasões", não se trataram de meras
campanhas militares, mas sim migrações de populações inteiras para o território
do império. A migração foi facilitada pela recusa das elites romanas em
financiar o seu exército. Os imperadores do século V eram na maior parte dos
casos controlados por militares influentes como Estilicão, Ricímero, Gundebaldo
ou Áspar, quase sempre estrangeiros ou de ascendência estrangeira. Após a
interrupção da linha de sucessão, muitos dos reis que os substituíram provinham
igualmente de forças militares. Era também comum o casamento entre os novos
reis e as elites romanas locais. Isto deu origem a uma incorporação gradual dos
hábitos das tribos invasoras na cultura romana, incluindo assembleias populares
que permitiram aos líderes tribais ter uma voz ativa em matérias políticas. Os artefatos
deixados por Romanos ou pelos invasores são na sua maioria similares, sendo
nítida a inspiração dos objetos tribais nos modelos romanos. De igual modo, a
maior parte da cultura intelectual dos novos reinos baseava-se diretamente nas
tradições intelectuais romanas. No entanto, uma diferença substancial foi a
perda gradual de rendimento tributário em função das novas políticas. Muitas
das novas instituições governativas já não financiavam os seus exércitos com o
dinheiro proveniente de impostos, mas com a atribuição de terras ou senhorios.
Isto levou ao desaparecimento do sistema de coleta de impostos, uma vez que
deixou de haver necessidade para cobranças ou cálculos de grande envergadura. O
belicismo era comum entre reinos e dentro dos próprios reinos. A escravatura
entrou também em declínio, à medida que a oferta se reduzia e a sociedade se
tornava cada vez mais rural.
Síliqua
de Teodorico, o Grande (r. 474–526)
|
Entre
os séculos V e VIII, uma nova vaga de governantes preenche o vazio político
deixado pela administração central romana. Os Ostrogodos estabelecem-se na
província romana de Itália no fim do século V, sob o comando de Teodorico, e
dão início a um reino notável pela cooperação entre Itálicos e Ostrogodos, pelo
menos durante o seu reinado. Os Burgúndios estabelecem-se na Gália, e depois de
um primeiro reino dizimado pelos Hunos em 436, formam um novo na década de 440
entre a atual Genebra e Lyon, e que durante o início do século VI se viria a
tornar num dos mais influentes reinos da região. No norte da Gália, os Francos
e os Bretões formam pequenos reinos. O Reino Franco centra-se no noroeste da
Gália e o primeiro reinante do qual se possui informação relevante é Childerico
I, que viria a morrer em 481. Durante o reinado do seu filho, Clóvis I, o reino
franco expande-se e converte-se ao cristianismo. Os Bretões, procedentes da
Britânia, estabelecem-se no que é hoje a Bretanha. Os Visigodos estabelecem o
seu reino em grande parte da península Ibérica, sendo o noroeste peninsular
ocupado pelo Reino Suevo e o norte de África pelo Reino Vândalo. Durante o
século VI, os Lombardos estabelecem-se no norte de Itália, substituindo o Reino
Ostrogótico por um grupo de ducados responsáveis pela eleição de um rei comum.
Por volta do fim do século VI, este sistema foi substituído por uma monarquia
permanente.
A
migração europeia significou uma alteração profunda do mapa demográfico da
Europa, embora o povoamento não tenha sido homogêneo. Algumas regiões, como a
península Ibérica, albergaram um número de colonos muito maior quando comparado
com outras regiões. A ocupação da Gália foi também superior e em maior
densidade no noroeste do que no sudeste. Os povos Eslavos ocuparam a Europa
Central e de Leste até à península Balcânica. Esta migração foi também
acompanhada por alterações profundas na língua. O latim, língua oficial do
Império Romano do Ocidente, foi gradualmente substituído por várias línguas de
raiz latina, embora já bastante distintas, denominadas coletivamente por
línguas românicas. No entanto, a evolução do latim para as novas línguas como o
francês, português ou romeno foi um processo que ocorreu ao longo de séculos, e
atravessou uma série de fases. O grego permaneceu como língua oficial do
Império Bizantino, mas as migrações dos Eslavos permitiram a assimilação de
línguas eslavas no leste europeu.
Baixa Idade Média
Durante
toda a Baixa Idade média, e até ao surto epidêmico do século XIV, a população
Europeia cresceu a um ritmo sem precedentes. As estimativas apontam para um
crescimento de 35 para 80 milhões entre os anos 1000 e 1347. Têm sido
identificadas como causas prováveis a melhoria nas técnicas agrícolas, a
relativa paz e ausência de invasões, o declínio da escravatura e um extenso
período de clima moderado e aumento da temperatura média. Apesar deste
crescimento, cerca de 90% da população era ainda eminentemente rural embora, de
forma progressiva, as quintas isoladas tenham dado lugar a pequenas comunidades
como aldeias ou vilas, e tenha sido comum a agregação em volta de propriedades
senhoriais. A população urbana, ainda muito escassa durante a Alta Idade Média,
cresce assinalavelmente durante os séculos XII e XIII, a par da expansão urbana
e da fundação de imensos centros populacionais, embora ao longo de todo o
período seja provável que nunca tenha excedido os 10% da população total.
A democracia da igreja católica tem um pé na Idade Média |
A
estrutura social e econômica tinha por base as relações feudais. Embora não
fosse proprietária, a nobreza detinha os direitos de exploração e tributação de
grande parte dos terrenos agrícolas. Os servos obtinham o direito a cultivar e
habitar as terras de determinada família nobre mediante o pagamento de uma
renda na forma de trabalho, gêneros ou moeda. Em troca, recebiam proteção econômica e militar. Ao longo dos séculos XI e XII, estas terras, ou feudos,
tornam-se hereditárias. Em muitas regiões, ao contrário do que acontecia na
Alta Idade Média, a dificuldade em dividi-las pelos herdeiros faz com que
passem a ser herdadas apenas pelo primogênito. Dentro da própria nobreza,
verifica-se a existência de uma hierarquia de vassalagem através da suserania,
onde são concedidas terras ou estruturas de importância econômica para
exploração a um nobre menor, em troca da sua vassalagem e fidelidade. Durante
os séculos XI e XII, a posse destas terras, ou feudos, viria a ser considerada
hereditária. No entanto, ao contrário do que sucedia na Alta Idade Média, a
maioria dos feudos deixou de ser dividida entre todos os herdeiros para passar
a ser herdada em exclusivo pelo filho varão. O domínio da nobreza durante este
período deve-se em grande parte ao controlo das terras agrícolas e dos
castelos, ao serviço militar na cavalaria pesada e às várias isenções de
impostos ou obrigações de que desfrutavam. A introdução da cavalaria pesada na
Europa teve origem nos catafractários persas dos séculos V e VI, mas será a
introdução do estribo no século VII que virá permitir fazer uso de todo o
potencial de combate destas unidades. Em resposta aos vários tumultos dos
séculos IX e X, assiste-se a um surto construtivo de castelos, local de refúgio
da população em tempos de ataque.
O
clero dividia-se entre o secular, parte da comunidade local, e o regular, que
vivia numa comunidade fechada segundo uma ordem religiosa e era normalmente
constituído por monges. A maior parte dos membros do clero regular, assim como
as hierarquias de topo do clero secular, era de origem nobre. Os párocos locais
provinham na maior parte das vezes do povo.
Na
Flandres e no Norte e Centro de Itália, o crescimento de cidades que eram, até
certo ponto, autônomas, proporcionou um significativo desenvolvimento econômico e criou uma situação favorável ao aparecimento de novos modelos comerciais. As potências econômicas ao longo do Báltico estabeleceram uma série de acordos que deram
origem à Liga Hanseática, e as cidades-Estado italianas como Veneza, Gênova e
Pisa criaram uma imensa rede de rotas comerciais por todo o Mediterrâneo. Para
além do desenvolvimento comercial, as inovações agrícolas e tecnológicas deste
período vieram permitir o aumento da produtividade das explorações agrícolas,
levando à criação de excedentes em abundância para trocas comerciais. Surgem
também novos processos financeiros. Procede-se novamente à cunhagem de moeda em
ouro, inicialmente em Itália e mais tarde em França e no resto da Europa.
Surgem novas formas de contratos comerciais, permitindo a gestão de risco entre
os mercadores. São aperfeiçoados os métodos de contabilidade e introduzidas as
cartas de crédito que vieram permitir a rápida transação monetária nas redes
comerciais.
Ao
longo da Idade Média, exigia-se que a mulher assumisse um papel de subordinação
a um elemento masculino – o pai, o marido ou outro parente. Embora às viúvas
fosse permitida bastante autonomia, existiam ainda algumas restrições legais. O
trabalho da mulher era na sua maioria ligado às tarefas domésticas. As
camponesas assumiam frequentemente a educação das crianças, a jardinagem e a
criação de animais nos arredores da casa, podendo complementar o rendimento
familiar com fiação fabrico de cerveja em casa. Durante as colheitas,
esperava-se que ajudassem no trabalho de campo. A mulher urbana, tal como a
camponesa, era responsável pela gestão doméstica, podendo também exercer
algumas das atividades comerciais, dependendo do país e do período. As mulheres
nobres tinham permissão para governar as terras na ausência do elemento
masculino, embora normalmente lhes fosse vedada a participação em assuntos
militares e governativos. Entre o clero, apenas podiam assumir o papel de
freiras, uma vez que só os Homens se podiam tornar padres.