Cícero Romão Batista (Crato, 24 de março de 1844 —
Juazeiro do Norte, 20 de julho de 1934) foi um sacerdote católico brasileiro.
Na devoção popular, é conhecido como Padre
Cícero ou Padim Ciço.
Carismático, obteve grande prestígio e influência sobre a vida social, política
e religiosa do Ceará bem como do Nordeste.
Proprietário
de terras, de gado e de diversos imóveis, Cícero fazia parte da sociedade e
política conservadora do sertão do Cariri. Sempre teve o médico Floro
Bartolomeu como o seu braço direito, e integrava o sistema político cearense
que ficou sob o controle da família Accioli durante mais de 2 décadas.
Nascido
no interior do Ceará, era filho de Joaquim Romão Batista e Joaquina Vicência
Romana, conhecida como dona Quinô. Ainda aos 6 anos, começou a estudar com o
professor Rufino de Alcântara Montezuma.
Padre Cícero |
Um
fato importante marcou a sua infância: o voto de castidade feito aos 12 anos,
influenciado pela leitura da vida de São Francisco de Sales.
Em
1860, foi matriculado no colégio do renomado padre Inácio de Sousa Rolim, em
Cajazeiras, na Paraíba. Aí pouco demorou, pois a inesperada morte de seu pai,
vítima de cólera em 1862, obrigou-o a interromper os estudos e voltar para
junto da mãe e das irmãs solteiras. A morte do pai, que era pequeno comerciante
no Crato, trouxe sérias dificuldades financeiras à família de tal sorte que,
mais tarde, em 1865, quando Cícero Romão Batista precisou ingressar no
Seminário da Prainha, em Fortaleza, só o fez graças à ajuda de seu padrinho de
crisma, o coronel Antônio Luís Alves Pequeno.
Ordenação
Durante
o período em que esteve no seminário, Cícero era considerado um aluno mediano
e, apesar de anos depois arrebatar multidões com seus sermões, apresentou notas
baixas nas disciplinas relacionadas à oratória e eloquência.
O Jovem Cicero e Sua Única Irmã D. Angélica. |
Cícero
foi ordenado padre no dia 30 de novembro de 1870. Após sua ordenação retornou
ao Crato e, enquanto o bispo não lhe dava paróquia para administrar, ficou a
ensinar latim no Colégio Padre Ibiapina, fundado e dirigido pelo professor José
Joaquim Teles Marrocos, seu primo e grande amigo.
Chegada a Tabuleiro Grande
No
natal de 1871, convidado pelo professor Simeão Correia de Macedo, o padre
Cícero visitou pela primeira vez o povoado de Juazeiro (numa fazenda localizada
na povoação de Juazeiro, então pertencente à cidade do Crato), e ali celebrou a
tradicional missa do galo.
O
padre visitante, então aos 28 anos, estatura baixa, pele branca, cabelos
louros, penetrantes olhos azuis e voz modulada, impressionou os habitantes do
lugar. E a recíproca foi verdadeira. Por isso, decorridos alguns meses,
exatamente no dia 11 de abril de 1872, lá estava de volta, com bagagem e
família, para fixar residência definitiva no Juazeiro.
Muitos
livros afirmam que Padre Cícero resolveu fixar morada em Juazeiro devido a um
sonho (ou visão) que teve, segundo o qual, certa vez, ao anoitecer de um dia
exaustivo, após ter passado horas a fio a confessar as pessoas do arraial, ele
procurou descansar no quarto contíguo à sala de aulas da escolinha, onde
improvisaram seu alojamento, quando caiu no sono e a visão que mudaria seu
destino se revelou. Ele viu, conforme relatou aos amigos íntimos, Jesus Cristo
e os doze apóstolos sentados à mesa, numa disposição que lembra a última Ceia,
de Leonardo da Vinci. De repente, adentra ao local uma multidão de pessoas
carregando seus parcos pertences em pequenas trouxas, a exemplo dos retirantes
nordestinos. Cristo, virando-se para os famintos, falou da sua decepção com a
humanidade, mas disse estar disposto ainda a fazer um último sacrifício para
salvar o mundo. Porém, se os homens não se arrependessem depressa, Ele acabaria
com tudo de uma vez. Naquele momento, Ele apontou para os pobres e, voltando-se
inesperadamente ordenou: - E você, Padre Cícero, tome conta deles!
Apostolado
Uma
vez instalado, foras e viúvas para a organização de uma irmandade leiga,
formada por beatas, sob sua inteira autoridade.
Atuou
sempre com zelo na recepção dos imigrarmado por um pequeno aglomerado de casas
de taipa e uma capelinha erigida pelo primeiro capelão-padre Pedro Ribeiro de
Carvalho, em honra a Nossa Senhora das Dores, padroeira do lugar, ele tratou
inicialmente de melhorar o aspecto da capelinha, adquirindo várias imagens com
as esmolas dadas pelos fiéis.
Depois,
tocado pelo ardente desejo de conquistar o povo que lhe fora confiado por Deus,
desenvolveu intenso trabalho pastoral com pregação, conselhos e visitas
domiciliares, como nunca se tinha visto na região. Dessa maneira, rapidamente
ganhou a simpatia dos habitantes, passando a exercer grande liderança na
comunidade.
Paralelamente,
agindo com muita austeridade, cuidou de moralizar os costumes da população,
acabando pessoalmente com os excessos de bebedeira e com a prostituição.
Restaurada
a harmonia, o povoado experimentou, então, os passos de crescimento, atraindo
gente da vizinhança curiosa por conhecer o novo capelão.
Para
auxiliá-lo no trabalho pastoral, o padre Cícero resolveu, a exemplo do que
fizera Padre Ibiapina, famoso missionário nordestino falecido em 1883, recrutar
mulheres solteintes, dentre eles pode-se destacar José Lourenço Gomes da Silva,
líder do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto.
No
ano de 1889, durante uma missa celebrada pelo padre Cícero, a hóstia ministrada
pelo sacerdote à religiosa Maria de Araújo se transformou em sangue na boca da
religiosa. Segundo relatos, tal fenômeno se repetiu diversas vezes durante
cerca de dois anos. Rapidamente espalhou-se a notícia de que acontecera um
milagre em Juazeiro.
A
pedido de padre Cícero a diocese formou uma comissão de padres e profissionais
da área da saúde para investigar o suposto milagre. A comissão tinha como
presidente o padre Clycério da Costa e como secretário o padre Francisco
Ferreira Antero, contava, ainda, com a participação dos médicos Marcos
Rodrigues Madeira e Ildefonso Correia Lima, além do farmacêutico Joaquim
Secundo Chaves. Em 13 de outubro de 1891, a comissão encerrou as pesquisas e
chegou à conclusão de que não havia explicação natural para os fatos ocorridos,
sendo portanto um milagre.
Insatisfeito
com o parecer da comissão, o bispo Dom Joaquim José Vieira nomeou uma nova
comissão para investigar o caso, tendo como presidente o padre Alexandrino de
Alencar e como secretário o padre Manoel Cândido. A segunda comissão concluiu
que não houve milagre, mas sim um embuste.
Dom
Joaquim se posicionou favorável ao segundo parecer e, com base nele, suspendeu
as ordens sacerdotais de padre Cícero e determinou que Maria de Araújo, que
viria a morrer em 1914, fosse enclausurada.
Dia da morte do Padre Cícero |
Em
1898, padre Cícero foi a Roma, onde se reuniu com o Papa Leão XIII e com
membros da Congregação do Santo Ofício, conseguindo sua absolvição. No entanto,
ao retornar a Juazeiro, a decisão do Vaticano foi revista e padre Cícero teria
sido excomungado, porém, estudos realizados décadas depois pelo bispo Dom
Fernando Panico sugerem que a excomunhão não chegou a ser aplicada de fato.
Atualmente, Dom Fernando conduz o processo de reabilitação do padre Cícero
junto ao Vaticano.
Em
13 de dezembro de 2015, Padre Cícero recebeu perdão da Igreja Católica.
Todos os anos no feriado da sexta-feira da paixão vários romeiros escolhem como roteiro para este período a visita aos locais de devoção
a Padre Cícero.
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Política
Era
filiado ao extinto Partido Republicano Conservador (PRC). Foi o primeiro
prefeito de Juazeiro do Norte, em 1911, quando o povoado foi elevado a cidade.
Em 1926 foi eleito deputado federal, porém não chegou a assumir o cargo.
Em
4 de outubro de 1911, o padre Cícero e outros 16 líderes políticos da região se
reuniram em Juazeiro e firmaram um acordo de cooperação mútua bem como o
compromisso de apoiar o governador Antônio Pinto Nogueira Accioli. O encontro
recebeu a alcunha de Pacto dos Coronéis, sendo apontado como uma importante
passagem na história do coronelismo brasileiro.
Padre Cícero e Floro Bartolomeu - a união entre religião e política no sertão do Ceará |
Em
1913, foi destituído do cargo pelo governador Marcos Franco Rabelo, voltando ao
poder em 1914, quando Franco Rabelo foi deposto no evento que ficou conhecido
como Sedição de Juazeiro. Foi eleito, ainda, vice-governador do Ceará, no
Governo do General Benjamin Liberato Barroso.
Ao
fim dos anos 20, o padre Cícero começou a perder a sua força política, que praticamente
acabou depois da Revolução de 1930. Seu prestígio como santo milagreiro, porém,
aumentaria cada vez mais.
Ligação com o cangaço
Virgulino
Ferreira da Silva, o Lampião, era devoto de padre Cícero e respeitava as suas
crenças e conselhos. Os dois se encontraram uma única vez, em Juazeiro do
Norte, em 1926. Naquele ano, a Coluna Prestes, liderada por Luís Carlos
Prestes, percorria o interior do Brasil desafiando o Governo Federal. Para
combatê-la foram criados os chamados Batalhões Patrióticos, comandados por
líderes regionais que muitas vezes arregimentavam cangaceiros.
Existem
duas versões para o encontro. Na primeira, difundida por Billy Jaynes Chandler,
o sacerdote teria convocado Lampião para se juntar ao Batalhão Patriótico de
Juazeiro, recebendo em troca, anistia de seus crimes e a patente de Capitão.[9]
Na outra versão, defendida por Lira Neto e Anildomá Willians, o convite teria
sido feito por Floro Bartolomeu sem que padre Cícero soubesse.
O
certo é que ao chegarem em Juazeiro, Lampião e os 49 cangaceiros que o
acompanhavam, ouviram padre Cícero aconselhá-los a abandonar o cangaço. Como
Lampião exigia receber a patente que lhe fora prometida, Pedro de Albuquerque
Uchoa, único funcionário público federal no município, escreveu em uma folha de
papel que Lampião seria, a partir daquele momento, Capitão e receberia anistia
por seus crimes. O bando deixou Juazeiro sem enfrentar a Coluna Prestes.
O
padre Cícero faleceu em Juazeiro do Norte em 20 de julho de 1934, aos 90 anos,
encontrando-se sepultado na Igreja de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, na
mesma cidade.