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quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Candomblé: Os Caçadores de Cabeças

Hoje, na incessante busca pelo falso prestígio, muitas pessoas ditas Sacerdotes, não se furtam em “caçar cabeças” para poder ostentar uma grandiosa roda de Iyawos/Egbon/Ògáns, nem que para isso, tenham que ignorar a Ética e Moral que deveriam existir entre casas e, sobretudo, entre Sacerdotes.

Mas muitos podem dizer: Um Sacerdote “caçar a cabeça” de alguém? Não são os filhos “rebeldes” que buscam outro terreiro?
Em verdade, as duas situações ocorrem, cremos que a primeira com maior incidência. Na primeira postagem da série, falamos da ética e solidariedade que deve existir quando um confrade religioso falece, no entanto, é nesse momento que muitos falsos sacerdotes se aproveitam para “caçar a cabeça” de um Omo Òrìsà. Infelizmente, há “sacerdotes” que mesmo no velório, iniciam as investidas com os filhos de santo do falecido. Por vezes, com uma conversa aparentemente confortadora, mas que deixa aquela pessoa em dúvidas. Vejamos:
“olha, a sua Ìyálòrìsà faleceu, mas pode contar comigo, afinal será que a pessoa que assumir tem o conhecimento necessário?”;
“meu filho, eu sei da sua dor, mas você precisa logo lavar a sua cabeça, esse é o meu cartão, não evite em me procurar”;
“eu lamento a sua perda, fico mais triste ainda porque acho que sua casa não terá continuidade, mas a minha casa está de portas abertas para recebê-lo”.
Talvez para muitos, isso pode parecer surreal, no entanto, ocorre com freqüência, mostrando que muitos deixam a ética de lado, para angariar novos rebentos.
Algo que também fere de forma contundente as convenções éticas do Candomblé está relacionado ao oráculo tendencioso e desrespeitoso. Os falsos sacerdotes, para conseguir uma nova cabeça, geralmente proferem em seu jogo:
“Olha, você não é do Òrìsà que você foi iniciado, mas não se preocupe porque eu vou colocar o santo correto na sua cabeça e você, a partir de agora, será desse santo. A pessoa que te iniciou não sabe nada de Candomblé, ele é maluco, ainda bem que você me encontrou”.
Nesses casos, nobres leitores, onde está a Ética Moral e Religiosa desse dito “Sacerdote/Sacerdotisa”?
Não podemos tapar o sol com a peneira e dar costas às feituras erradas e mesmo indevidas que existem. Incorretas quando de fato uma pessoa é iniciada para uma Divindade que não seja a sua e, indevida, quando simplesmente uma pessoa foi iniciada sem ser esse o seu Destino, sendo que há pessoas que não devem ser iniciadas.
Em Salvador, há um respeito muito grande entre os Terreiros. Muitos filhos de santo de uma casa nem tentam buscar o jogo de outro terreiro, pois sabem que, na maioria das vezes terão como resposta:
“Você não é da casa de fulano? Olha, ele é meu amigo, gosto muito do seu Pai, vá procurar ele, que certamente ele vai te ajudar”. Isso se chama Ética.
Mas há situações que o Sacerdote sabe que aquela pessoa, verdadeiramente “caiu em mãos erradas” e abre o jogo. Nesses casos, o jogo de búzios revelando que aquela pessoa já iniciada é regida por outra Divindade, o Sacerdote deve sim ser verdadeiro com a pessoa. Deve explicar que a Divindade para qual ele fora iniciado, não é em verdade o regente do seu Orì. No entanto, deve elucidar que, santo feito não se muda. Deve esclarecer que há obrigações que podem ser realizadas, de modo que o verdadeiro regente do Orì da pessoa seja cultuado, mas que o Òrìsà para o qual ele foi iniciado não pode ser esquecido e, principalmente, deve ter a convicção plena de suas afirmações.
Entretanto, o que mais vemos é o oposto. É justamente um Sacerdote ignorar tudo o que foi feito em uma pessoa para fazer valer a sua verdade/vontade, mostrando que tudo pode e que está acima de tudo e de todos, mesmo dos nossos Deuses, os Òrìsàs.
Mas aqui, cabe uma reflexão especial: Onde vai parar a Divindade que ao longo de anos foi cultuada na cabeça daquela pessoa? A pessoa sempre foi incorporada por uma Divindade e, de uma hora para outra, é incorporada por outra Divindade e a Divindade do passado é nada mais que passado?