Chama-se
Cruzada a qualquer um dos movimentos militares de inspiração cristã que
partiram da Europa Ocidental em direção à Terra Santa (nome pelo qual os
cristãos denominavam a Palestina) e à cidade de Jerusalém com o intuito de
conquistá-las, ocupá-las e mantê-las sob domínio cristão.
Estes movimentos
estenderam-se entre os séculos XI e XIII, época em que a Palestina estava sob
controle dos turcos muçulmanos. No médio oriente, as cruzadas foram chamadas de
"invasões francas", já que os povos locais viam estes movimentos
armados como invasões e porque a maioria dos cruzados vinha dos territórios do
antigo Império Carolíngio e se autodenominavam francos.
Os
ricos e poderosos cavaleiros da Ordem de São João de Jerusalém (Hospitalários)
e dos Cavaleiros Templários foram criados durante as Cruzadas. O termo é também
usado, por extensão, para descrever, de forma acrítica, qualquer guerra
religiosa ou mesmo um movimento político ou moral.
O
termo cruzada não era conhecido no tempo histórico em que ocorreu. Na época
eram usadas, entre outras, as expressões "peregrinação" e
"guerra santa". O termo Cruzada surgiu porque seus participantes se
consideravam soldados de Cristo, distinguidos pela cruz aposta a suas roupas.
As Cruzadas eram também uma peregrinação, uma forma de pagamento a alguma
promessa, ou uma forma de pedir alguma graça, e era considerada uma penitência.
Por
volta do ano 1000, aumentou muito a peregrinação de cristãos para Jerusalém,
pois corria a crença de que o fim dos tempos estava próximo e, por isso,
valeria a pena qualquer sacrifício para evitar o inferno. Incidentalmente, as
Cruzadas contribuíram muito para o comércio com o Oriente.
Depois
da morte de Maomé (632), vagas de exércitos árabes lançaram-se com novo fervor
à conquista dos seus antigos dominadores, os bizantinos e os persas sassânidas,
que vinham de décadas de guerra. Estes últimos, depois de serem esmagadoramente
derrotados em algumas batalhas, levaram 30 anos para ser destruídos, devido
mais à extensão do seu império do que à sua resistência militar: o último xá
morreu em Cabul em 655. Os bizantinos resistiram bem menos: cederam uma parte
da Síria, a Palestina, o Egito e o norte de África, mas ao fim sobreviveram e
mantiveram sua capital Constantinopla.
Em
novo impulso, os exércitos conquistadores muçulmanos lançaram-se então sobre a
Índia, a península Ibérica, o sul de Itália, a França, e as ilhas
mediterrâneas. Tendo se tornado uma civilização tolerante e brilhante sob o
ponto de vista intelectual e artístico, o império muçulmano sofreu de
gigantismo e viu enfraquecer-se militar e politicamente. Aos poucos, as zonas
mais longínquas tornaram-se independentes ou então foram recuperadas pelos seus
inimigos, bizantinos, francos, reinos neo-godos, os quais guardavam na memória
a época de conquista.
No
século X, essa desagregação acentuou-se, em parte devido à influência de grupos
de mercenários convertidos ao islão que tentaram criar reinos separados. Os
turcos seljúcidas (não confundir com os turcos otomanos antepassados dos
criadores do atual estado da Turquia), procuraram impedir esse processo e
conseguiram unificar uma parte do território. Acentuaram a guerra contra os
cristãos, esmagaram as forças bizantinas em Manziquerta em 1071 conquistando,
assim, o leste e o centro da Anatólia e Jerusalém em 1078.
Depois
de um período de expansão nos séculos X e XI o Império Bizantino viu-se em
sérias dificuldades: a braços com revoltas de nómadas ao norte da fronteira, e
perda dos territórios da península Itálica, conquistados pelos normandos.
Internamente, a expansão dos grandes domínios em detrimento do pequeno
campesinato resultou numa diminuição dos recursos financeiros e humanos
disponíveis ao estado. Como solução, o imperador Aleixo I Comneno decidiu pedir
auxílio militar ao Ocidente para fazer frente à ameaça seljúcida.
O
domínio dos turcos seljúcidas sobre a Palestina foi percebido pelos cristãos do
Ocidente como uma ameaça e uma forma de repressão sobre os peregrinos e os
cristãos do Oriente. Em 27 de janeiro de 1095, no concílio de Clermont, o papa
Urbano II exortou os nobres franceses a libertar a Terra Santa e a colocar
Jerusalém de novo sob soberania cristã, apresentando a essa expedição militar
como uma forma de penitência. A multidão presente aceitou entusiasticamente o
desafio e logo partiu em direção ao Oriente, sobrepondo uma cruz vermelha sobre
suas roupas (daí terem recebido o nome de "cruzados"). Assim
começavam as cruzadas.
Cruzada
Popular ou dos Mendigos (1096)
A
Cruzada Popular ou dos Mendigos (1096) foi um acontecimento extra-oficial que
consistiu em um movimento popular que bem caracteriza o misticismo da época e
começou antes da Primeira Cruzada oficial. O monge Pedro, o Eremita, graças a
suas pregações comoventes, conseguiu reunir uma multidão. Entre os guerreiros,
havia uma multidão de mulheres, velhos e crianças.
Pedro
o Eremita prega a cruzada ao povo (ilustração de
Gustave Doré, século XIX)
|
Na
busca de recursos financeiros para o longa viagem até a Palestina, estes
cruzados buscaram infiéis ricos mais próximos de suas casas. Assim, começaram a
atacar judeus europeus. As primeiras vítimas foram os judeus da Renânia.
Inspirado por Pedro o Eremita, o conde Emich de Leisengen marcou a própria
testa com queimadura em forma de cruz e liderou um grupo de peregrinos para
atacar os judeus da cidade de Spier. Apesar da oposição do bispo católico da
cidade, os peregrinos mataram muitos judeus que se recusaram a abraçar a fé
cristã. O mesmo bando seguiu depois até Worms, atacou a Judengasse e matou mais
de mil judeus. O grupo prosseguiu até Mogúncia, onde mais 990 judeus foram
mortos.
Ataques
a judeus ocorreram também na Colônia, Trier, Metz, Praga e Ratisbona e o
sentimento antijudeu espalhou-se pela França e Inglaterra.
Ante
a impaciência da multidão, em Oedenburg (atual Sopron), Pedro despachou seu
comandante militar Walter o Impiedoso com cinco mil cruzados. Ao chegar à
cidade bizantina de Belgrado, os cruzados começaram a pilhar a área rural e 150
deles morreram em confronto com a população local
Auxiliado
por um cavaleiro, Guautério Sem-Haveres, os peregrinos atravessaram a Alemanha,
Hungria e Bulgária, causando desordens e desacatos, sendo em parte aniquilados
pelos búlgaros.
Em
1 de agosto de 1096, chegaram em péssimas condições a Constantinopla. Mal
equipada e mal alimentada, essa cruzada massacrou, pilhou e destruiu. Ainda
assim, o imperador bizantino Aleixo I Comneno recebeu os seguidores do eremita
em Constantinopla. Prudentemente, Aleixo aconselhou o grupo a aguardar a
chegada de tropas mais bem equipadas. Mas a turba começou a saquear a cidade.
O
imperador bizantino, desejando afastar esse "bando turbulento" de sua
capital, obrigou-os a se alojar fora de Constantinopla, perto da fronteira
muçulmana, e procurou incentivá-los a atacar os infiéis. Foi um desastre, pois
a Cruzada dos Mendigos chegou muito enfraquecida à Ásia Menor, onde foi
arrasada pelos turcos. Somente um reduzido grupo de integrantes conseguiu
juntar-se à cruzada dos cavaleiros.
Durante
um mês, mais ou menos, tudo o que os cavaleiros turcos fizeram foi observar a
movimentação dos invasores, que se ocupavam apenas de saquear as regiões
próximas do acampamento onde foram alojados. Até que, em agosto de 1096, o
bando inquieto cansou-se de esperar e partiu para a ofensiva.
Quando
parte dos europeus resolveu partir em direção às muralhas de Niceia (atual
İznik), cidade dominada pelos muçulmanos, uma primeira patrulha de soldados do sultão
turco Kilij Arslan foi enviada, sem sucesso, para barrá-los. Animado pela
primeira vitória, o exército do Eremita continuou o ataque a Niceia, tomou uma
fortaleza da região e comemorou se embriagando, sem saber que estava caindo
numa emboscada. O sultão mandou seus cavaleiros cercarem a fortaleza e cortarem
os canais que levavam água aos invasores. Foi só esperar que a sede se
encarregasse de aniquilá-los e derrotá-los, o que levou cerca de uma semana.
Quanto
ao restante dos cruzados maltrapilhos, foi ainda mais fácil exterminá-los. Tão
logo os francos tentaram uma ofensiva, marchando lentamente e levantando uma
nuvem de poeira, foram recebidos por um ataque de flechas. A maioria morreu ali
mesmo, já que não dispunha de nenhuma proteção. Os que sobreviveram fugiram em
pânico.
O
sultão, que havia ouvido histórias temíveis sobre os francos, respirou
aliviado. Mal imaginava ele que aquela era apenas a primeira invasão e que
cavaleiros bem mais preparados ainda estavam por vir.
Primeira Cruzada (1096-1099)
Foi
chamada também de Cruzada dos Nobres ou dos Cavaleiros. Ao pregar e prometer a
salvação a todos os que morressem em combate contra os pagãos (muçulmanos) em
1095, o papa Urbano II estava a criar um novo ciclo. É certo que a ideia não
era totalmente nova: parece que já no século IX se declarara que os guerreiros
mortos em combate contra os muçulmanos na Sicília mereciam a salvação.
As
várias versões que nos restam do seu apelo mostram que Urbano relatou também os
infortúnios dos cristãos do oriente, e sublinhou que se até então os cavaleiros
do ocidente habitualmente combatiam entre si perturbando a paz, poderiam agora
lutar contra os verdadeiros inimigos da fé, colocando-se ao serviço de uma boa
causa. O apelo foi feito a todos sem distinção, pobres ou ricos. E foi, de
facto, o que sucedeu. Mas os ricos e pobres rapidamente formaram cruzadas
separadas.
Por
volta de 1097, um exército de 30 mil homens, dentre eles muitos peregrinos,
cruzou a Ásia Menor, partindo de Constantinopla. A cruzada dos cavaleiros,
possuindo recursos, embora progredindo devagar, fizera um acordo com o
imperador bizantino de lhe devolver os territórios conquistados aos turcos.
Liderada por grandes senhores, levava quer proprietários, quer filhos segundos
da nobreza. Esse acordo seria desrespeitado, à medida que o mal-entendido entre
as duas partes cresceria.
Os
bizantinos pretendiam um grupo de mercenários solidamente enquadrados ao qual
se pagasse o soldo e que obedecesse às ordens - não aquelas turbas
indisciplinadas; os cruzados não estavam dispostos, depois de tantos
sacrifícios a entregar o que obtinham. Apesar da animosidade entre os líderes e
das promessas quebradas entre os cruzados e os bizantinos que os ajudavam, a
Cruzada prosseguiu. Os turcos estavam simplesmente desorganizados. A cavalaria
pesada e a infantaria francas não tinham experiência em lutar contra a
cavalaria leve e arqueiros turcos, e vice-versa. A resistência e a força dos
cavaleiros venceram a campanha em uma série de vitórias, a maioria muito
difíceis.
Em
19 de junho de 1097, os cruzados cercaram e tomaram Niceia (atual İznik),
devolvendo-a aos bizantinos, e logo tomaram o rumo de Antioquia. Em julho,
foram atacados pelos turcos em Dorileia, mas conseguiram vencê-los e, após
penosa marcha, chegaram aos arredores de Antioquia em 20 de outubro. A cidade
de Antioquia somente cairia, após longo cerco, a 3 de junho de 1098, com a
ajuda de um sentinela armênio que facilitou a entrada dos cruzados nas muralhas
da cidade. Seguiu-se um saque terrível da população muçulmana da cidade, que
ficou na posse de Boemundo de Taranto, o chefe dos normandos.
Godofredo
de Bulhão, após longo cerco, conquistou Jerusalém atacando uma guarnição fraca
em 1099. A repressão foi violenta. Segundo o arcebispo Guilherme de Tiro, a cidade
oferecia tal espetáculo, tal carnificina de inimigos, tal derramamento de
sangue que os próprios vencedores ficaram impressionados de horror e
descontentamento. Godofredo de Bulhão ficou só com o título de protector e, à
sua morte, Balduíno, seu irmão, proclamou-se rei. Os cristãos humilharam-se
após as duas conquistas massacrando muito dos residentes, indiferentemente da
idade, fé ou sexo. Após a vitória, era preciso organizar a conquista. Surgiram
quatro estados cruzados, conhecidos coletivamente como Outremer
("Ultramar"), do norte para o sul: o Condado de Edessa, o Principado
de Antioquia, o Condado de Trípoli, e o Reino de Jerusalém.
O
sucesso da primeira cruzada pelas indisciplinadas tropas foi até certo ponto
uma surpresa e ocorreu porque os cruzados chegaram num momento de desordem
naquela periferia do mundo islâmico. Uma vez conquistado o território ao
inimigo, os cruzados, cujos desentendimentos com os bizantinos começaram ainda
durante a campanha, não mais quiseram devolver as terras aos seus irmãos de fé
cristã do Império Bizantino.
Muitos
dos combatentes retiraram-se uma vez conquistada Jerusalém (incluindo os
grandes senhores), mas um núcleo ficou (cálculos chegam a falar de algumas
centenas de cavaleiros e um milhar de homens a pé). As cidades principais (como
Antioquia, Edessa) tornarem-se capitais de principados e reinos (embora
Jerusalém fosse de certo modo o centro político e religioso), com outras marcas
a protegê-los.
O
sistema feudal foi transplantado para oriente com algumas alterações: muitas
vezes, em vez de receber feudos, os cavaleiros eram pagos com direitos ou
rendas (modalidade que existia também na Europa). As cidades mercantis
italianas tornaram-se fundamentais para a sobrevivência desses estados:
permitiram a chegada de reforços e interceptar os movimentos das esquadras
muçulmanas, tornando o Mediterrâneo novamente um mar navegável pelos
ocidentais. Mas rapidamente os muçulmanos iriam reagir.
De
qualquer modo, nos anos seguintes, com a euforia da vitória, mais voluntários
seguiram para o Oriente. Os contingentes seguiam por nacionalidades,
continuando pouco organizados. As motivações eram variáveis: se alguns
pretendiam obter novos feudos, ou redimir-se das suas faltas, havia também
aqueles que "apenas" pretendiam ganhar batalhas, cobrir-se de glória,
bênçãos espirituais, e voltar para a sua terra.
Os
governantes cruzados encontravam-se em grande desvantagem numérica em relação
às populações muçulmanas que eles tentavam controlar. Assim, construíram
castelos e contrataram tropas mercenárias para mantê-los sob controle. A
cultura e a religião dos francos era muito estranha para cativar os residentes
da região. Dos seguros castelos, os cruzados interceptavam cavaleiros árabes.
Por
aproximadamente um século, os dois lados mantiveram um clássico conflito de
guerrilha. Os cavaleiros francos eram muito fortes, mas lentos. Os árabes não
aguentavam um ataque da cavalaria pesada, mas podiam cavalgar em círculo em
volta dela, na esperança de incapacitar as unidades dos francos e fazer
emboscadas no deserto. Os reinos cruzados localizavam-se, em sua maioria, no
litoral, pelo qual eles podiam receber suprimentos e reforços, mas as
constantes incursões e o infeliz populacho mostravam que eles não eram um
sucesso econômico.
Por
volta do ano 1100, uma nova expedição partiu. Chegados a Constantinopla,
levantaram-se discussões com os bizantinos que estavam fartos de ter aqueles
vizinhos incómodos que pilhavam a terra, portavam-se de uma forma muito mais
brutal em guerra, e ficavam com o que conquistavam (para além das diferenças
culturais e religiosas).
Entretanto,
os turcos estavam a unificar-se para tentar fazer face a estas ameaça. Evitando
combates diretos até ao último momento contra a cavalaria pesada cristã, usaram
tácticas de emboscadas. Em Mersivan, esmagaram um dos exércitos cristãos (o dos
lombardos e francos) que fora abandonado pelos seus líderes e cavaleiros (que
fugiram). Estes foram severamente criticados pela fuga, assim como Aleixo,
imperador bizantino, por não ter dado apoio.
Outro
grupo, o exército de Nivernais, também foi destruído de forma similar (com fuga
de líderes incluída). A expedição da Aquitânia portou-se melhor: ao menos os cavaleiros
ficaram a combater e morrer juntamente com o povo. Alguns poucos conseguiram
fugiram para Constantinopla. Três exércitos aniquilados em dois meses, enquanto
que o pequeno exército de Jerusalém (com o membros da Primeira Cruzada)
derrotava um exército egípcio.
Por
alguns anos, não foram pregadas mais cruzadas, e os territórios cristãos no
oriente tiveram de se aguentar por conta própria. Assumiram como padroeiro São
Jorge da Capadócia, exemplo de cavaleiro cristão, e seu brasão de armas, a cruz
vermelha num escudo branco.
Entretanto
ordens de monges cavaleiros foram formadas para lutar pelas terras sagradas e
cuidar dos peregrinos. Os cavaleiros templários e hospitalários eram, em sua
maioria, francos ou seus vassalos. Os cavaleiros teutônicos eram germânicos.
Esses eram os mais organizados, bravios e determinados do que os cruzados, mas
nunca eram suficientes para fazer a região ficar segura. Os reinos cruzados
sobreviveram por um tempo, em parte porque aprenderam a negociar, conciliar e
jogar os diferentes grupos árabes uns contra os outros.
O
condado de Edessa caiu em 1144, sob Zangi, governante de Alepo e Mosul. Caíram
mais tarde Antioquia em 1268, Trípoli em 1289 e o último posto dos Cruzados,
Acre, durou até 1291.
Segunda Cruzada (1147-1149)
Em
1145, foi pregada uma nova cruzada por Eugénio III e São Bernardo. A perda do
Condado de Edessa provocou a organização dessa cruzada. Desta vez foram reis
que responderam ao apelo: Luís VII da França e Conrado III do Sacro Império,
para nomear os mais importantes. Curiosamente, os contingentes flamengos e
ingleses acabaram por conquistar Lisboa e voltar para as suas terras na sua
maioria, uma vez que eram concedidas indulgências para quem combatia na
Península Ibérica.
O
exército de Conrado acabou esmagado pelos turcos num momento de repouso. O que
sobrou juntou-se aos franceses, com o apoio dos templários. Com algumas
dificuldades de transporte, mais uma vez uma parte do exército teve de ser
abandonada para trás (sobretudo os plebeus a pé), e estes tiveram de abrir
caminho contra os turcos.
Luís
VII e Conrado em Jerusalém, depois de algumas discussões, acabaram por ser
convencidos a atacar Damasco, mas ao fim de poucos dias tiveram que se retirar
perante a ameaça de uma parte dos nobres fazê-lo por conta própria. O resultado
desta cruzada foi miserável (se excetuarmos a conquista de Lisboa), tendo
sucesso apenas em azedar as relações entre os reinos cruzados, os bizantinos e
os governantes muçulmanos amigáveis. Nenhuma nova cruzada foi lançada até a um
novo acontecimento: a conquista de Jerusalém pelos muçulmanos em 1187. Os
cristãos enfrentavam um adversário decidido, Saladino.
Jerusalém Medieval |
Terceira Cruzada (1189-1192)
A
Terceira Cruzada, pregada pelo papa Gregório VIII após a tomada de Jerusalém
pelo sultão Saladino em 1187, foi denominada Cruzada dos Reis. É assim
denominada pela participação dos três principais soberanos europeus da época:
Filipe Augusto (França), Frederico Barba-Ruiva (Sacro Império Romano-Germânico)
e Ricardo Coração de Leão (Inglaterra).
O
imperador Frederico Barba-Ruiva, atendendo os apelos do papa, partiu com um
contingente alemão de Ratisbona e tomou o itinerário danubiano atravessando com
sucesso a Ásia Menor, porém afogou-se na Cilícia ao atravessar o Sélef (atual
rio Göksu). A sua morte representou o fim prático desse núcleo. Os reis de
França e Inglaterra passaram o tempo todo a querelar-se, até que aquele se
retirou.
Se
Ricardo Coração de Leão conseguiu alguns atos notáveis (a conquista de Chipre,
Acre, Jaffa e uma série de vitórias contra efetivos superiores) também não teve
pejo em massacrar prisioneiros (incluindo mulheres e crianças). Com Saladino,
teve um adversário à altura, combatendo e travando um subtil táctico. Em 1192,
acabou-se por chegar a um acordo: os cristãos mantinham o que tinham
conquistado e obtinham o direito de peregrinação, desde que desarmados, a
Jerusalém (que ficava em mãos muçulmanas).
Se
esse objetivo principal falhara, alguns resultados tinham sido obtidos:
Saladino vira a sua carreira de vitórias iniciais entrar num certo impasse e o
território de Outremer (o nome que era dado aos reinos cruzados no oriente)
sobrevivera.
Quarta Cruzada (1202-1204)
A
Quarta Cruzada foi denominada também de Cruzada Comercial, por ter sido
desviada de seu intuito original pelo doge (duque) Enrico Dandolo, de Veneza,
que levou os cristãos a saquear Zara e Constantinopla, onde foi fundado o Reino
Latino de Constantinopla, fazendo com que o abismo entre as igrejas Ocidental e
Oriental se estabelecesse definitivamente.
Financiados
por Veneza, cavaleiros cristãos atacam a capital do
Império Bizantino durante a
Quarta Cruzada
|
O
papa Inocêncio III apelou a uma cruzada em 1198 para conquistar Jerusalém (o objetivo
falhado da Terceira Cruzada), mas os preparativos começariam dois anos depois.
Vários grandes senhores trouxeram exércitos e estipularam um acordo com Veneza
que transportaria essas tropas na sua frota em troca de uma quantia. O problema
é que muitos dos senhores acabaram por não ir, e os que foram não tinham
condições para pagar o valor estipulado (que era fixo).
Foi
criado um novo acordo então: os cruzados conquistariam Zara, uma cidade
veneziana na Dalmácia que se revoltara, em troca de um adiamento do pagamento.
Entretanto chegaram notícias do Império Bizantino. O imperador Isaac II fora
derrubado pelo seu irmão Aleixo III e fora cegado. O filho de Isaac II, de nome
Aleixo IV, conseguira fugir e apelara aos cruzados para o ajudarem: em troca de
o colocarem no trono prometia-lhes dinheiro e os recursos do império para a
conquista de Jerusalém. Ainda hoje os historiadores discutem se as coisas se
passaram assim ou se foi uma justificação para o que se iria suceder.
Os
cruzados aceitaram imediatamente uma vez que isso parecia resolver os seus
problemas. Partiram em 1202. O papa considerou que se atacassem território
cristão (nomeadamente Zara) ficariam excomungados. A cidade foi conquistada e
depois de deixarem passar o inverno atacaram Constantinopla. A cidade resistiu,
mas o imperador Aleixo III acabou por fugir com o tesouro da cidade.
Com
novos impostos a ser lançados para pagar as promessas feitas aos cruzados,
rapidamente a população ficou à beira da revolta. Aleixo V, um parente afastado
fez um golpe matando Aleixo IV e colocando novamente na prisão Isaac II que
fora libertado pelos cruzados e governara com o filho.
Os
cruzados decidiram então conquistar em proveito próprio o império, nomear um
imperador latino e dividir os territórios. Aleixo fugiu com algum tesouro e a
cidade foi saqueada pelos latinos durante três dias. Estátuas, mosaicos,
relíquias, riquezas acumuladas durante quase um milénio foram pilhadas ou
destruídas durante os incêndios. A cidade sofreu um golpe tão terrível que
nunca mais conseguiu se recompor, mesmo depois de voltar a ser grega em 1261. E
assim terminou a Quarta Cruzada, pois ninguém pensou mais em dirigir-se para
Jerusalém: a maioria regressou com o que roubara, alguns ficaram com feudos no
oriente.
Quinta Cruzada (1217-1221)
Também
pregada por Inocêncio III, partiu em 1217 e foi liderada por André II, rei da
Hungria, e por Leopoldo VI, duque da Áustria. Decidiu-se que para se conquistar
Jerusalém era necessário conquistar o Egito primeiro, uma vez que este
controlava esse território.
Desembarcados
em São João D'Acre, decidiram atacar Damietta, cidade que servia de acesso ao
Cairo, a capital. Depois de conquistar uma pequena fortaleza de acesso
aguardaram reforços e se colocaram a caminho. Depois de alguns combates, e
quando tudo parecia perdido, uma série de crises na liderança egípcia
permitiram aos cruzados ocupar o campo inimigo. O sultão acabou por oferecer o
reino de Jerusalém e uma enorme quantia se os cristãos retirassem; o cardeal
Pelágio, que se tornara num dos chefes da expedição, acabou por convencer os
restantes a recusar.
Começaram
a cercar Damietta e depois de algumas batalhas sofreram uma derrota. O sultão
renovou a proposta, mas foi novamente recusada. Depois de um longo cerco, que
durou de fevereiro a novembro, a cidade caiu. Os conflitos entre os cruzados
agudizaram-se e perdeu-se tanto tempo que os egípcios recuperaram forças.
Reforços até 1221 chegaram aos cristãos. Lançaram-se numa ofensiva, mas os
muçulmanos foram retirando-se e levaram os cruzados a uma armadilha; sem comida
e cercados acabaram por ter de chegar a um acordo: retiravam-se do Egito e
tinham suas vidas salvas.
Sexta Cruzada (1228-1229)
Foi
liderada pelo imperador do Sacro Império Frederico II de Hohenstauffen, que
tinha sido excomungado pelo papa. Ele partiu com um exército que foi diminuindo
com as deserções, e uma semi-hostilidade das forças cristãs locais devido à sua
excomunhão. Aproveitando-se das discórdias entre os muçulmanos, Frederico II
conseguiu, por intermédio da diplomacia, um tratado com o sultão aiúbida
al-Kamil que lhe concedia a posse de Jerusalém, Belém e Nazaré por dez anos.
Mas a derrota dos cristãos em Gaza fê-los perder os Santos Lugares em 1244.
Sétima Cruzada (1248-1254)
Foi
liderada pelo rei da França Luís IX, posteriormente canonizado como São Luís.
Ele desembarcou diretamente no Egito e, depois de alguns combates, conquistou
Damietta. Novamente o sultão ofereceu Jerusalém e novamente foi recusado. Em
Mansurá, depois de quase terem vencido, os cruzados são derrotados pela
imprudência do irmão do rei, Roberto de Artois. Depois de uma retirada
desastrosa, o exército rendeu-se. Luís IX caiu prisioneiro e os cristãos
tiveram de pagar um pesado resgate pela sua libertação. Somente a resistência
da rainha francesa em Damietta permitiu que se conseguisse negociar com os
egípcios. Luís ficou mais algum tempo e conseguiu salvar o território de
Outremer (indiretamente, as invasões mongóis deram o seu contributo).
Oitava Cruzada (1270)
Os egípcios da dinastia mameluca
em
1265, tomaram Cesareia, Haifa e Arsuf;
em
1266, ocuparam a Galileia e parte da Armênia
em
1268, conquistaram Antioquia.
O
Oriente Médio vivia uma época de anarquia entre as ordens religiosas que
deveriam defendê-lo, bem como entre comerciantes genoveses e venezianos.
O
rei francês Luís IX retomou então o espírito das cruzadas e lançou novo
empreendimento armado, a Oitava Cruzada, em 1270, embora sem grande percussão
na Europa. Os objetivos eram agora diferentes dos projetos anteriores:
geograficamente, o teatro de operações não era o Levante mas antes Túnis, e o
propósito, mais que militar, era a conversão do emir da mesma cidade
norte-africana.
Luís
IX partiu inicialmente para o Egito, que estava sendo devastado pelo sultão
Baibars. Dirigiu-se depois para Túnis, na esperança de converter o emir da
cidade e o sultão ao cristianismo. O sultão Maomé recebeu-o de armas nas mãos.
A expedição de São Luís redundou como quase todas as outras expedições, numa
tragédia. Não chegaram sequer a ter oportunidade de combater: mal desembarcaram
as forças francesas em Túnis, logo foram acometidas por uma peste que assolava
a região, ceifando inúmeras vidas entre os cristãos, nomeadamente São Luís e um
dos seus filhos. O outro filho do rei, Filipe, o Audaz, ainda em 1270, firmou
um tratado de paz com o sultão e voltou à Europa. Chegou a Paris em maio de
1271 e foi coroado rei, em Reims, em agosto do mesmo ano.
Nona Cruzada (1271-1272)
Em
1268, Baibars, sultão mameluco de Egito, havia reduzido o Reino Latino de
Jerusalém, o mais importante Estado cristão estabelecido pelos cruzados, a uma
pequena faixa de terra entre Sídon e Acre.
Alguns
meses após a morte de Luís IX, na Oitava Cruzada, o príncipe Eduardo da
Inglaterra, depois Eduardo I, comandou os seus seguidores até Acre. Em 1271 e
inícios de 1272, conseguiu combater Baibars, após firmar alianças com alguns
governantes da região adversários dele. Em 1272, estabeleceu contatos para
firmar uma trégua, mas Baibars tentou assassiná-lo, enviando homens que
fingiram buscar o batismo como cristãos. Eduardo, então, começou preparativos
para atacar Jerusalém, quando chegaram notícias da morte de seu pai, Henrique
III. Eduardo, como herdeiro ao trono, decidiu retornar à Inglaterra e assinou
um tratado com Baibars, que possibilitou seu retorno e, assim, terminou a Nona
Cruzada.
Acontecimentos posteriores
O
equilíbrio na região permaneceu frágil. Os anos seguintes viram um aumento das
demandas dos Mamelucos, como também aumentaram as perseguições aos peregrinos,
contrariando os termos da trégua. Em 1289, o sultão mameluco Qalawun juntou um
grande exército, investiu sobre o que restava do Condado de Trípoli, e,
finalmente, cercou a capital, Trípoli, e tomou-a depois de um sangrento
assalto. O ataque, porém, foi particularmente devastador para os Mamelucos,
porque a resistência cristã alcançou proporções fanáticas e Qalawun perdeu seu
filho primogênito e mais capaz na campanha. Ele esperou outros dois anos para
recuperar sua força.
Em
1291, um grupo de peregrinos de Acre foi atacado e, em represália, mataram
dezenove comerciantes muçulmanos em uma caravana síria. (Outra versão diz que
um grupo de soldados italianos católicos degolaram os islâmicos e eliminaram na
mesma leva outro tanto de sírios cristãos.) Qalawun exigiu que eles pagassem
uma quantia extraordinária em compensação. Quando nenhuma resposta veio, o
Sultão usou isto como um pretexto para sitiar Acre, e acabar com o último
estado Cruzado independente na Terra Santa.
Em
abril de 1291, a cidade acordou cercada por milhares de soldados muçulmanos. A
cristandade correu em socorro de um de seus pontos mais estratégicos na Terra
Santa. Cavaleiros hospitalários, teutônicos e templários, somados a tropas
inglesas e italianas, partiram para defender o porto de Acre. Em 18 de maio de
1291, as forças turcas e egípcias tomaram a cidade de Acre. Qalawun morreu
durante o ataque, deixando Khalil como Sultão Mameluco. Com Acre tomada, os
Estados Cruzados deixaram de existir. Caía assim o último bastião dos europeus
na Palestina.
Rapidamente,
os poucos territórios estabelecidos pelos cruzados que restavam no Oriente
Médio foram reconquistados pelos muçulmanos. Inicialmente, o centro do poder
dos Cruzados foi movido para o norte (para Tortosa), e finalmente para a ilha
de Chipre. Sua última posição segura na Terra Santa, a ilha de Rodes, foi
perdida em 1302-1303. O período dos Cruzadas na Terra Santa estava terminado,
quase duzentos anos depois do papa Urbano II iniciar sua pregação.
Causas do fracasso
Diversas
razões contribuíram para o fracasso das Cruzadas, entre elas: os europeus eram
minoria, em meio a uma população geralmente hostil; a opressão à população
nativa fez com que o domínio fosse cada vez mais difícil; as diversas lutas
entre os próprios cristãos contribuíram para enfraquecê-los enormemente. Todas,
exceto a pacífica sexta Cruzada (1228-1229), foram prejudicadas pela cobiça e
brutalidade; judeus e cristãos na Europa foram massacrados por turbas armadas
em seu caminho para a Terra Santa. O papado era incapaz de controlar as imensas
forças à sua disposição.
O legado das cruzadas
As
cruzadas influenciaram a cavalaria europeia e, durante séculos, sua literatura.
Se
por um lado aprofundaram a hostilidade entre o cristianismo e o Islã, por outro
estimularam os contatos econômicos e culturais para benefício permanente da
civilização europeia. O comércio entre a Europa e a Ásia Menor aumentou
consideravelmente e a Europa conheceu novos produtos, em especial, o açúcar e o
algodão. Os contatos culturais que se estabeleceram entre a Europa e o Oriente
tiveram um efeito estimulante no conhecimento ocidental e, até certo ponto,
prepararam o caminho para o Renascimento.
A jihad
No
início do século XII, o mundo muçulmano tinha praticamente esquecido a Jihad, a
guerra religiosa travada contra os inimigos do Islão. A explosiva expansão da
sua religião durante o século VIII tinha-se reduzido às memórias de grandeza
dessa época. Após a queda de Jerusalém, muitos proeminentes líderes religiosos,
como o qadi Abu Sa’ ad al-Harawi, tentaram convencer o califa abássida a
preparar a Jihad contra os firanji (de francos, que era como os muçulmanos se
referiam aos europeus). No entanto, somente perto de duas décadas depois é que
o sultão turco designou um proeminente militar, um atabeg chamado Zengi, para
resolver o problema firanj.
Após
a primeira cruzada, a moral dos muçulmanos estava de rastos. Os firanj detinham
uma reputação de ferocidade entre os turcos e os árabes. Com os espetaculares
sucessos em Antioquia e Jerusalém, os firanj pareciam quase imparáveis. Eles
humilhavam o poderoso califado egípcio anualmente e faziam investidas em terras
inimigas impunemente. Excetuando os vassalos do Egito, a maioria dos
aterrorizados líderes muçulmanos dos territórios mais próximos pagavam um
pesado tributo para assegurar a paz. Zengi iniciou o longo e lento processo de
modificar a imagem que os muçulmanos tinham dos firanj.
Tendo
recebido o domínio das terras à volta de Mossul e Alepo, Zengi começou uma
campanha contra os firanj em 1132 com a ajuda do seu lugar-tenente Sawar. Em
cinco anos, conseguiu reduzir o número dos castelos importantes ao longo da
fronteira do Condado de Edessa e derrotou o exército firanj em batalha. Em
1144, capturou a cidade de Edessa e neutralizou de forma efetiva o primeiro
domínio estabelecido pelos Cruzados.
Zengi
foi o primeiro líder muçulmano a enfrentar os firanj e que não só sobreviveu,
como triunfou. Ele provou que os firanj podiam ser bloqueados. Os líderes de
Bagdad aprovaram os sucessos de Zengi, e cedo um grande número de títulos
precediam o seu nome: O Emir, o General, o Grande, o Justo, o Ajudante de Deus,
o Triunfante, o Único, o Pilar da Religião, a Pedra de Base do Islão, …Honra de
Reis, Apoiante de Sultões … o Sol dos Merecedores, … Protector do Príncipe dos
Fiéis. Zengi gostou tanto da enchente de elogios, que insistiu que os seus arautos
e escrivães utilizassem todos os títulos na sua correspondência.
Embora
Zengi fosse um grande herói militar, ele foi simplesmente muito implacável e
cruel nas suas campanhas contra Damasco para motivar os muçulmanos para uma
guerra religiosa. Uma noite do ano 1146, encontrando-se ele alcoolizado, ao ter
presenciado a um erro do seu eunuco particular, Lulu (pérola), e prometeu
mandá-lo executar por incompetência. Mais tarde, enquanto Zengi dormia, Lulu
pegou na adaga do seu dono e apunhalou-o repetidamente e fugiu, coberto pela
escuridão da noite.
O
herdeiro de Zengi, Nur al-Din, e o seu sucessor Salah al-Din (Saladino), eram
extremamente piedosos, observando rigidamente a Sunna e os Pilares do Islão na
sua vida pública e particular. Ambos rodearam-se de religiosos e teólogos e
sábios em geral. Para além disso fizeram uma activa campanha para espalhar o
fervor religioso e propaganda entre os seus súbditos muçulmanos. Com os seus
exemplos de religiosidade, Nur al-Din iniciou – e o seu sucessor Salah al-Din
cultivou – uma guerra religiosa, uma jihad, contra os Firanj. Enquanto que
Zengi apenas podia contar com os seus soldados, o apelo à jihad atraiu os
soldados muçulmanos de toda a Arábia, Egito e Pérsia. Este massivo exército
permitiu Salah al-Din esmagar os firanj na Batalha de Hattin e enfraquecer as
forças da Terceira Cruzada de Ricardo Coração de Leão.
A
chama da Jihad de Salah al-Din deixou de arder em 1193, quando morreu. O irmão
do sultão, Saphadin, não pretendia entrar em mais guerras, e quando Ricardo
Coração de Leão foi para a Europa, o poderio militar dos firanj estava
praticamente neutralizado e não mais necessidade de derramamento de sangue. A
partir desta altura Saphadim acreditava que a coexistência pacífica com Firanj
ainda era possível. Várias décadas mais tarde, uma jihad iria finalmente purgar
os firanj da Síria e Palestina, embora até 1291, os muçulmanos ainda
partilhassem uma pequena parte desse território com os firanj.
As cruzadas na reconquista de
Portugal
Quando
surgiu o reino de Portugal, a cristandade agitava-se no fervor das Cruzadas do
Oriente. Os portos de Galiza, que davam acesso a Santiago de Compostela, a
barra do rio Douro e a vasta baía de Lisboa, eram pontos de escala das frotas
de cruzados que do Norte da Europa seguiam para a Terra Santa. Quando, em 1140,
Afonso I tentou a conquista de Lisboa, fê-lo com o auxílio de estrangeiros:
setenta navios franceses que tinham entrado a barra do Douro e aportado a Gaia.
Mas a conquista não foi possível devido às poderosas defesas que rodeavam
Lisboa.
Em
1147, entra na barra do Douro, vinda de Dartmouth, uma frota de 200 velas,
transportando cruzados de várias nações: alemães, flamengos, normandos e
ingleses num total de 13 000 homens. Aproveitando este fato, Afonso I escreveu
ao bispo do Porto D. Pedro, pedindo-lhe que persuadisse os cruzados a
ajudarem-no na empresa, prometendo-lhes o saque da cidade. No dia seguinte
desembarcaram os cruzados em Lisboa, que tiveram as últimas negociações com D.
Afonso, firmando o pacto. Depois da tomada da cidade, muitos cruzados ficaram
por lá. Um capitão de cruzados, Jourdan, foi senhor e parece que o primeiro
povoador da Lourinhã. Ao francês Allardo foi doada Vila Verde dos Francos, no
distrito de Lisboa e concelho de Alenquer (perto da Serra do Montejunto).
Alguns
anos depois, em 1152, partiu de Bergen uma esquadra de peregrinos do Norte da
Europa, comandados por Rognvaldo III, rei das Órcades, com 15 navios e 2 000
homens. No inverno do ano seguinte, esta esquadra estava nas costas de Galiza
onde pilhou algumas povoações. No verão de 1154 desce a costa portuguesa e
ajuda o monarca na conquista de Alcácer do Sal. A empresa era rendosa, pois a
cidade era o mais importante porto do Sado, cercada de pinhais, cujas madeiras
eram utilizadas na construção de navios. A empresa falhou e o mesmo se deu anos
mais tarde desta vez com a ajuda da frota do conde da Flandres composta de
franceses e flamengos, e partiu para a Síria em 1157, aportando à barra do
Tejo.
Em
1189, D. Sancho I entra em negociações com outra esquadra, que acabou por
entrar na baía de Lagos e ocuparam o Castelo de Albur (Alvor), um dos mais
fortes da região. Meses depois entra no Tejo outra frota alemã que tocara em
Dartmouth recebendo muitos peregrinos e que ajudou a conquistar Silves. Capital
de província, populosa, grande centro de comércio e de cultura, a cidade estava
bem fortificada. A notícia destas vitórias chegou ao Norte de África e a
resposta não se fez esperar.
Os
mouros põem cerco a Silves, que não conseguiram tomar, partindo o califa em direção
a Santarém, tomando Torres Novas no caminho e pondo o cerco a Tomar. Perante
esta situação, D. Sancho I pediu auxílio aos cruzados vassalos de Ricardo
Coração de Leão, que se tinham reunido no Tejo, e foram ter a Santarém, que não
chegou a ser atacada por causa da peste que vitimou a maior parte dos mouros.
No
ano seguinte, os mouros regressam reconquistando Silves, a província de
Alcácer, com exceção de Évora. Anos depois outra armada de cruzados, mesmo sem
terem chegado a acordo com D. Sancho I, tomam Silves e saqueiam a cidade,
prosseguindo para a Síria. Em 1212, com a derrota na Batalha de Navas de Tolosa,
o reino mouro entra em decadência. Em 1217, entra nova frota alemã, e D.
Soeiro, bispo de Lisboa, convenceu-os a conquistar Alcácer do Sal, navegando a
esquadra por Setúbal, com os seus 100 navios. Alcácer resistiu durante dois
meses até capitular. No princípio do Inverno regressa a frota ao Tejo, passando
aí o resto do inverno.