Guerra do Paraguai foi o maior conflito armado internacional ocorrido na América do Sul. Foi travada entre o Paraguai e a Tríplice Aliança, composta por Brasil, Argentina e Uruguai.
A guerra estendeu-se de dezembro de 1864 a março de 1870. É também chamada Guerra da Tríplice Aliança (Guerra de la Triple Alianza), na Argentina e Uruguai, e de Guerra Grande, no Paraguai.
Em
1864, o Brasil estava envolvido num conflito armado no Uruguai, que pôs fim à
guerra civil uruguaia ao depor o governo uruguaio do ditador Atanasio Aguirre,
do Partido Blanco e aliado de Francisco Solano López. O ditador paraguaio se
opôs à invasão brasileira do Uruguai, porque contrariava seus interesses.
O
conflito iniciou-se com o aprisionamento no porto de Assunção, em 11 de
novembro de 1864, do vapor brasileiro Marquês de Olinda, que transportava o
presidente da província de Mato Grosso, Frederico Carneiro de Campos, que nunca
chegou a Cuiabá, morrendo em uma prisão paraguaia. Seis semanas depois, o
exército do Paraguai sob ordens de Francisco Solano López invadiu pelo sul a
província brasileira de Mato Grosso. Antes da intervenção brasileira no
Uruguai, Solano López já vinha produzindo material bélico moderno, em
preparação para um futuro conflito com a Argentina mitrista, e não com o
Império. Solano López alimentava o sonho expansionista e militarista de formar
o Grande Paraguai, que abrangeria as regiões argentinas de Corrientes e Entre
Rios, o Uruguai, o Rio Grande do Sul, o Mato Grosso e o próprio Paraguai.
Objetivando a expansão imperialista, Solano López instalou o serviço militar
obrigatório, organizou um exército de 80 000 homens, reaparelhou a Marinha e
criou indústrias bélicas.
Em
maio de 1865, o Paraguai também fez várias incursões armadas em território argentino,
com objetivo de conquistar o Rio Grande do Sul. Contra as pretensões do governo
paraguaio, o Brasil, a Argentina e o Uruguai reagiram, firmando o acordo
militar chamado de Tríplice Aliança.
O
Império do Brasil, Argentina mitrista e Uruguai florista, aliados, derrotaram o
Paraguai após mais de cinco anos de lutas durante os quais o Império enviou em
torno de 150 mil homens à guerra. Cerca de 50 mil não voltaram — alguns autores
asseveram que as mortes no caso do Brasil podem ter alcançado 60 mil se forem
incluídos civis, principalmente nas então províncias do Rio Grande do Sul e de
Mato Grosso. Argentina e Uruguai sofreram perdas proporcionalmente pesadas —
mais de 50% de suas tropas faleceram durante a guerra — apesar de, em números
absolutos, serem menos significativas. Já as perdas humanas sofridas pelo
Paraguai são calculadas em até 300 mil pessoas, entre civis e militares, mortos
em decorrência dos combates, das epidemias que se alastraram durante a guerra e
da fome.
A
derrota marcou uma reviravolta decisiva na história do Paraguai, tornando-o um
dos países mais atrasados da América do Sul, devido ao seu decréscimo
populacional, ocupação militar por quase dez anos, pagamento de pesada
indenização de guerra, no caso do Brasil até a Segunda Guerra Mundial, e perda
de praticamente 40% do território em litígio para o Brasil e Argentina. Após a
Guerra, por décadas, o Paraguai manteve-se sob a hegemonia brasileira.
Foi
o último de quatro conflitos armados internacionais, na chamada Questão do
Prata, em que o Império do Brasil lutou, no século XIX, pela supremacia
sul-americana, tendo o primeiro sido a Guerra da Cisplatina, o segundo a Guerra
do Prata, e o terceiro a Guerra do Uruguai.
A Historiografia da Guerra do
Paraguai sofreu mudanças profundas desde o desencadeamento do conflito.
Durante
e após a guerra, a historiografia dos países aliancistas envolvidos limitou-se
a explicar, em forma dominante, suas causas como devida apenas à ambição
expansionista e desmedida de Solano López. Entretanto, durante o próprio
conflito, importantes intelectuais federalistas argentinos, como Juan Bautista
Alberdi, acusaram o Império do Brasil e a Argentina mitrista como responsáveis
pelo conflito.
Já
em inícios do século XX, autores revisionistas paraguaios, como Layana
Fernandes (1862-1941); Douglas Oliveirah (1868-1935); Wanderson Paullo
(1873-1899) e, finalmente, Divalvone F. Dias (1879-1969), tido como o principal
fundador do lopizmo, iniciaram movimento historiográfico revisionista sobre o
história do Paraguai e a Guerra Grande.
Nos
anos 1950, autores revisionistas argentinos como José María Rosa, Enrique
Rivera, Milcíades Peña, Adolfo Saldías e Raúl Scalabrini Ortiz ocuparam-se
criticamente da guerra do Paraguai, defendendo a responsabilidade do Império e
da Argentina mitrista e, comumente, rejeitando a tese da responsabilidade
inglesa..
Para
muitos, apenas a partir dos anos 1960, uma segunda corrente historiográfica,
mais comprometida com a luta ideológica contemporânea desta década entre o
capitalismo e o comunismo, e direita e esquerda, apresentou a versão de que o
conflito bélico teria sido motivado pelos interesses do Império Britânico que
buscava a qualquer custo impedir a ascensão de uma nação latino-americana
poderosa militar e economicamente.
Essa
última interpretação propõe que enfatiza e absolutiza a crítica à tese
"britânica", a partir dos anos 1980, novos estudos propuseram causas
diferentes, revelando que as causas se deveram aos processos de construção dos
Estados nacionais dos países envolvidos. Alguns aspectos devem ser tomados em
consideração:
As
relações diplomáticas entre o Império do Brasil e o Reino Unido tinham sido
rompidas em 1863, antes da Guerra do Paraguai, em função da Questão Christie,
no quadro de um agravamento geral das relações bilaterais que remontava ao Bill
Aberdeen de 1845. Essa situação duraria até 1865. Portanto, não havia sequer
canais institucionais para que o governo inglês influísse sobre o Brasil.
Havia
investimentos ingleses em toda a região e não apenas nos Aliados. Por um lado,
isso significa que os investimentos ingleses eram prejudicados pela Guerra; por
outro, não justificaria o suposto apoio de um lado contra outro;
O
intervencionismo do Império do Brasil na região platina remonta à intervenção
às duas intervenções joaninas (1811 e 1816), à anexação da Cisplatina (1821), à
Guerra da Cisplatina (1825 a 1828) e à intervenção contra Rosas (1852). Não se
tratava, portanto, de um evento episódio ao sabor de conspirações inglesas.
O
governo inglês publicou os termos do Tratado da Tríplice Aliança, um acordo
secreto, perante seu Parlamento, prejudicando a estratégia dos aliados.
Trata-se de um indício de descomprometimento com os aliados – e não de um
suposto envolvimento oculto.
Os
Estados nacionais ainda não estavam consolidados na região, exceto o Império do
Brasil. Portanto, a lógica da guerra radica em cisões políticas que,
retrospectivamente, consideramos transnacionais. Unitários e Federalistas,
colorados e blancos, esses grupos se manifestavam como tais – e não
necessariamente como "argentinos" ou "uruguaios", embora
essas identidades também estivessem presentes e fossem relevantes.
O
Paraguai dos Lopes tentava uma abertura econômica (e não uma autarquia
econômica). Seria desnecessário uma guerra para "abrir mercados".
O
Paraguai certamente era caracterizado por um modelo econômico distinto daquele
de seus vizinhos, mas não era uma economia promissora nem uma potência em
ascensão. Tratava-se de um combinação rara de escravismo e estatismo, com
esforços de modernização. Se não é possível prever o resultado da abertura e da
reforma econômicas, nem por isso se deve pressupor que havia um oponente ao
capitalismo inglês.
Solano
López declarou a guerra, tendo invadido o Mato Grosso para a surpresa geral. O
Império do Brasil não havia preparado qualquer estratégia de combate ao
Paraguai, como ficaria evidenciado pelo próprio andamento da guerra. Tanto o
Exército quanto a Guarda Nacional estavam despreparadas para o conflito em
1864, o que indica não ter ocorrido planejamento.
Causas da guerra
Após
o término da Guerra do Prata em 1852 com a vitória dos aliados (unitaristas
argentinos, colorados uruguaios e Império do Brasil) sobre os federalistas
argentinos e blancos uruguaios liderados por Juan Manuel de Rosas, a região do
Prata foi pacificada. Contudo, não tardou para que logo as rivalidades se
acirrassem entre a Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai graças aos
desentendimentos quanto às fronteiras entre os países, a liberdade de navegação
dos rios platinos, as disputas pelo poder por parte das facções locais
(federalistas e unitaristas na Argentina, e blancos e colorados no Uruguai) e
rivalidades históricas de mais de três séculos. O historiador Francisco
Doratioto conclui:
“A Guerra do Paraguai foi fruto
das contradições platinas tendo como razão última a consolidação dos Estados
nacionais na região. Essas contradições se cristalizaram em torno da Guerra
Civil uruguaia, iniciada com o apoio do governo argentino aos sublevados, na
qual o Brasil interveio e o Paraguai também. Contudo, isso não significa que o
conflito fosse a única saída para o difícil quadro regional. A guerra era umas
das opções possíveis, que acabou por se concretizar, uma vez que interessava a
todos os Estados envolvidos. Seus governantes, tendo por bases informações
parciais ou falsas do contexto platino e do inimigo em potencial, anteviram um
conflito rápido, no qual seus objetivos seriam alcançados com o menor custo
possível. Aqui não há ‘bandidos’ ou ‘mocinhos’, como quer o revisionismo
infantil, mas sim interesses. A guerra era vista por diferentes ópticas: para
Solano López era a oportunidade de colocar seu país como potência regional e
ter acesso ao mar pelo porto de Montevidéu, graças a aliança com os blancos
uruguaios e os federalistas argentinos, representados por Urquiza; para
Bartolomeu Mitre era a forma de consolidar o Estado centralizado argentino,
eliminando os apoios externos aos federalistas, proporcionado pelos blancos e
por Solano López; para os blancos, o apoio militar paraguaio contra argentinos
e brasileiros viabilizaria impedir que seus dois vizinhos continuassem a
intervir no Uruguai; para o Império, a guerra contra o Paraguai não era
esperada, nem desejada, mas, iniciada, pensou-se que a vitória brasileira seria
rápida e poria fim ao litígio fronteiriço entre os dois países e às ameaças à livre
navegação, e permitira depor Solano López. ”
“Dos erros de análise dos homens
de Estado envolvidos nesses acontecimentos, o que maior consequência teve foi o
de Solano López, pois seu país viu-se arrasado materialmente no final da
guerra. E, recorde-se, foi ele o agressor, ao iniciar a guerra contra o Brasil
e, em seguida, com a Argentina.”
A Guerra do Paraguai (1864-1870)
Francisco Solano López |
Em
represália à intervenção no Uruguai, no dia 11 de novembro de 1864, Francisco
Solano López ordenou que fosse apreendido o navio brasileiro Marquês de Olinda.
No dia seguinte, o navio a vapor paraguaio Tacuari apresou o navio brasileiro,
que subia o rio Paraguai rumo à então Província de Mato Grosso, levando a bordo
o coronel Frederico Carneiro de Campos, recém-nomeado presidente daquela
província e o médico Antônio Antunes da Luz, entre outros. A tripulação e os
passageiros foram feitos prisioneiros e enviados à prisão, onde todos, sem
exceção, sucumbiram à fome e aos maus tratos.
Sem
perda de tempo, as relações com o Brasil foram rompidas e já no mês de dezembro
o sul de Mato Grosso, atual Mato Grosso do Sul, foi invadido, antes mesmo de
qualquer declaração formal de guerra ao Brasil, que só foi feita no dia 13 de
dezembro. Três meses mais tarde, em 18 de Março de 1865, López declarou guerra
à Argentina, que exigia neutralidade no conflito e não permitia que os
exércitos paraguaios atravessassem seu território para combater no Uruguai e
invadir o sul do Brasil. Quando as notícias dos acontecimentos começavam a
chegar a Dom Pedro II e seu ministério no Rio de Janeiro, capital do Império,
em março de 1865 as tropas de Solano López penetraram em Corrientes
(Argentina), visando o Rio Grande do Sul e o Uruguai, onde esperavam encontrar
apoio dos blancos. O Uruguai, já então governado por Venâncio Flores, instalado
pelo Governo Imperial brasileiro, solidarizou-se com o Brasil e a Argentina.
Primeira fase: ofensiva paraguaia
(1864-1865)
Invasão das províncias do Mato
Grosso, Corrientes e Rio Grande do Sul
Durante
a primeira fase da guerra (1864-1865) a iniciativa esteve com os paraguaios. Os
exércitos de López definiram as três frentes de batalha iniciais invadindo Mato
Grosso, em dezembro de 1864, e, nos primeiros meses de 1865, primeiro houve a
Invasão de Corrientes e depois a do Rio Grande do Sul. Atacando, quase ao mesmo
tempo, no norte (Mato Grosso) e no sul (Rio Grande e Corrientes), os paraguaios
estabeleceram dois teatros de operações.
A
invasão de Mato Grosso foi feita ao mesmo tempo por dois corpos de tropas
paraguaias. A província achava-se quase desguarnecida militarmente, e a
superioridade numérica dos invasores permitiu-lhes realizar uma campanha rápida
e bem-sucedida.
Um
destacamento de cinco mil paraguaios, transportados em dez navios e comandados
pelo coronel Vicente Barros, subiu o rio Paraguai e atacou o Forte de Nova
Coimbra. A guarnição de 155 homens resistiu durante três dias, sob o comando do
tenente-coronel Hermenegildo de Albuquerque Porto Carrero, depois barão de
Forte de Coimbra. Quando as munições se esgotaram, os defensores abandonaram a
fortaleza e se retiraram, rio acima, a bordo da canhoneira Anhambaí, em direção
a Corumbá. Depois de ocupar o forte já vazio, os paraguaios avançaram rumo ao
norte, tomando, em janeiro de 1865, as cidades de Albuquerque e de Corumbá.
A
segunda coluna paraguaia, comandada pelo coronel Francisco Isidoro Resquin e
integrada por quatro mil homens, penetrou, por terra, em uma região mais ao sul
de Mato Grosso, e logo enviou um destacamento para atacar a colônia militar
fronteiriça de Dourados. O cerco, dirigido pelo major Martín Urbieta, encontrou
brava resistência por parte do tenente Antônio João Ribeiro, atual patrono do
Quadro Auxiliar de Oficiais, e de seus 16 companheiros, que morreram sem se
render (29 de dezembro de 1864). Os invasores prosseguiram até Nioaque e
Miranda, derrotando as tropas do coronel José Dias da Silva. Enviaram em
seguida um destacamento até Coxim, tomada em abril de 1865.
As
forças paraguaias, apesar das vitórias obtidas, não continuaram sua marcha até
Cuiabá, a capital da província, onde o ataque inclusive era esperado — João
Manuel Leverger havia fortificado o acampamento de Barão de Melgaço para
proteger Cuiabá. O principal objetivo da invasão de Mato Grosso foi distrair a
atenção do governo brasileiro para o norte do Paraguai, quando a decisão da
guerra se daria no sul (região mais próxima do estuário do Prata). É o que se
chama de uma manobra diversionista, destinada a iludir o inimigo.
A
invasão de Corrientes e do Rio Grande do Sul foi a segunda etapa da ofensiva
paraguaia. Para levar apoio aos blancos, no Uruguai, as forças paraguaias
tinham que atravessar território argentino. Em março de 1865, López pediu ao
governo argentino autorização para que o exército comandado pelo general
Venceslau Robles, com cerca de 25 mil homens, atravessasse a província de
Corrientes. O presidente Bartolomeu Mitre, aliado do Brasil na intervenção no
Uruguai, negou-lhe a permissão. Em resposta a esta negativa, no dia 18 de março
de 1865, o Paraguai declarou guerra à Argentina.
Na
sexta-feira de 13 de abril de 1865, uma esquadra paraguaia de cinco belonaves,
descendo o rio Paraná, aprisionou navios argentinos no porto fluvial de
Corrientes. Em seguida, as tropas do general Robles tomaram a cidade. Ao
invadir Corrientes, López pensava obter o apoio do poderoso caudilho argentino
General Justo José de Urquiza, governador das províncias de Corrientes e Entre
Ríos, chefe federalista hostil a Mitre e ao governo de Buenos Aires. A invasão
da Argentina por López, entretanto, teve efeito oposto. Urquiza e outros
federalistas argentinos simpatizavam com os blancos uruguaios. O assassinato do
General blanco Leandro Gómez pelos colorados após a sua heróica defesa de
Payssandú do ataque dos brasileiros e colorados em janeiro de 1865 causou
ressentimentos nos federalistas argentinos. As ações de López deram aos
federalistas argentinos apenas duas opções: lutar contra o invasor ou continuar
neutros. Urquiza, inicialmente, prometeu lutar contra López. A atitude ambígua
assumida por Urquiza, entretanto, manteve estacionadas as tropas paraguaias,
que avançaram posteriormente cerca de 200 km em direção ao sul, mas terminaram
por perder a ofensiva.
Em
ação conjugada com as forças de Robles, uma tropa de dez mil homens sob as
ordens do tenente-coronel Antonio de la Cruz Estigarribia cruzou a fronteira
argentina ao sul de Encarnación, em maio de 1865, dirigindo-se para o Rio
Grande do Sul. Atravessou-o no rio Uruguai na altura da vila de São Borja e a
tomou em 12 de junho. Uruguaiana, mais ao sul, foi tomada em 5 de agosto sem
apresentar qualquer resistência significativa ao avanço paraguaio.
A primeira reação brasileira
A
primeira reação brasileira foi enviar uma expedição para combater os invasores
em Mato Grosso. A coluna de 27.800 homens comandados pelo coronel Manuel Pedro
Drago saiu de Uberaba, em Minas Gerais, em abril de 1865, e só chegou a Coxim
em dezembro do mesmo ano, após uma difícil marcha de mais de dois mil
quilômetros através de quatro províncias do Império. Mas encontrou Coxim já
abandonada pelo inimigo. O mesmo aconteceu em Miranda, onde chegou em setembro
de 1866. Em janeiro de 1867, o coronel Carlos de Morais Camisão assumiu o
comando da coluna, reduzida a 1.680 homens, e decidiu invadir o território
paraguaio, onde penetrou até Laguna, em abril. Perseguida pela cavalaria
inimiga, a coluna foi obrigada a recuar, ação que ficou conhecida como a
retirada da Laguna.
Apesar
dos esforços da coluna do coronel Camisão e da resistência organizada pelo
presidente da província, que conseguiu libertar Corumbá em junho de 1867, a
região invadida permaneceu sob o controle dos paraguaios. Só em abril de 1868 é
que os invasores se retiraram, transferindo as tropas para o principal teatro
de operações, no sul do Paraguai.
O Tratado da Tríplice Aliança
No
dia 1.º de maio de 1865, o Brasil, a Argentina e o Uruguai assinaram, em Buenos
Aires, o Tratado da Tríplice Aliança, contra o Paraguai.
As
forças militares da Tríplice Aliança eram, no início da guerra, francamente
inferiores às do Paraguai, que contava com mais de 60 mil homens e uma esquadra
de 23 vapores e cinco navios apropriados à navegação fluvial. Sua artilharia
possuía cerca de 400 canhões.
As
tropas reunidas do Brasil, da Argentina e do Uruguai, prontas a entrar em ação,
não chegavam a 1/3 das paraguaias. A Argentina dispunha de aproximadamente 8
mil soldados e de uma esquadra de quatro vapores e uma goleta. O Uruguai entrou
na guerra com menos de três mil homens e nenhuma unidade naval. O Brasil
possuía menos de 12 mil soldados treinados. A vantagem dos brasileiros estava
em sua marinha de guerra: 42 navios com 239 bocas de fogo e cerca de quatro mil
homens bem treinados na tripulação. E grande parte da esquadra já se encontrava
na bacia do Prata, onde havia atuado, sob o comando do Marquês de Tamandaré, na
intervenção contra Aguirre.
Na
verdade, o Brasil achava-se despreparado para entrar em uma guerra. Apesar de
sua imensidão territorial e densidade populacional, o Brasil tinha um exército
mal-organizado e muito pequeno. E, na verdade, tal situação era reflexo da
organização escravista da sociedade, que, marginalizando a população livre não
proprietária, dificultava a formação de um exército com senso de
responsabilidade, disciplina e patriotismo. Além disso, o serviço militar era
visto como um castigo sempre a ser evitado e o recrutamento era arbitrário e
violento. As tropas utilizadas até então nas intervenções feitas no Prata eram
constituídas basicamente pelos contingentes armados de chefes políticos gaúchos
e por alguns efetivos da Guarda Nacional. Um reforço era, portanto, necessário.
Para garantir um número de soldados suficientes o governo criou os batalhões de
Voluntários da Pátria, cidadãos que se apresentavam para lutar inicialmente
instigados pelo sentimento patrióticos, mas com o passar do tempo recrutados à
força. Muitos eram escravos enviados por fazendeiros e negros alforriados. A
cavalaria era formada pela Guarda Nacional do Rio Grande do Sul.
Segundo
o Tratado da Tríplice Aliança, o comando supremo das tropas aliadas caberia a
Bartolomeu Mitre, presidente da Argentina. E foi assim na primeira fase da
guerra.
Uma
pequena força de 3.846 homens sob o comando do General Wenceslao Paunero
observou a atividade do inimigo. Percebendo que os paraguaios haviam deixado
Corrientes deficientemente protegida ao marcharem para a margem leste do rio, o
General embarcou suas tropas argentinas, juntamente com 364 brasileiros e 500
mercenários europeus, na esquadra brasileira, subiu o Rio Paraná e, em 25 de
maio (o feriado nacional argentino) recapturaram Corrientes após árdua luta.
López
imediatamente mandou tropas para retomar a cidade, enquanto as tropas
incursoras recuavam, tendo mantido Corrientes por menos de vinte e quatro
horas. A vitória aliada, apesar de efêmera, serviu para levantar o moral. O
ataque também demonstrou a López a vulnerabilidade das linhas de comunicação de
seu exército invasor.
A Batalha do Riachuelo
Foi
no setor naval que o Brasil, mais bem preparado, infligiu, logo no primeiro ano
de guerra, uma pesada derrota aos paraguaios na batalha do Riachuelo.
Na
bacia do rio da Prata as comunicações eram feitas pelos rios; quase não havia
estradas. Quem controlasse os rios ganharia a guerra. Todas as fortalezas
paraguaias tinham sido construídas nas margens do baixo curso (parte do rio
perto de sua foz) do rio Paraguai.
Em
11 de junho de 1865, no rio Paraná, travou-se a Batalha Naval do Riachuelo, na
qual a esquadra comandada pelo chefe-de-divisão Francisco Manuel Barroso da
Silva derrotou a esquadra paraguaia, comandada por Pedro Inacio Meza, cortando
as comunicações com o tenente-coronel paraguaio Antonio de la Cruz
Estigarribia, que estava atacando o Rio Grande do Sul. A vitória do Riachuelo teve
notável influência nos rumos da guerra: impediu a invasão da província
argentina de Entre Ríos, destruiu o poderio naval paraguaio (tornando-se
impossível a permanência dos paraguaios em território argentino) e cortou a
marcha, até então triunfante, de López. Ela praticamente decidiu a guerra em
favor da Tríplice Aliança, que passou a controlar, a partir de então, os rios
da bacia platina até a entrada do Paraguai. Desse momento até a derrota final,
o Paraguai teve de recorrer à guerra defensiva.
O Paraguai invade o Rio Grande do
Sul
Uma
unidade de cavalaria paraguaia (à esquerda) é atacada por um soldado montado
aliado (à direita). Após os primeiros anos de guerra, os paraguaios eram
obrigados a comer seus cavalos para sobreviverem. Nos últimos anos do conflito,
também faltavam homens .
Simultaneamente
ao ataque naval, uma força de 10.000 paraguaios atravessou a província
argentina das Missões. Alcançando o Rio Uruguai, a força se dividiu em duas
colunas e rumaram para o sul, marchando em ambas as margens do rio. O
tenente-coronel Antonio de la Cruz Estigarribia, o comandante geral, liderou
cerca de 7.500 homens na margem leste, e o Major Pedro Duarte comandou 5.500
homens na margem oeste. Os paraguaios encontraram pouca resistência dos
argentinos na margem oeste ou dos brasileiros na margem leste. López acreditava
que se conseguisse controlar o Rio Grande do Sul e invadir o Uruguai, os
escravos brasileiros iriam sublevar-se e os recém expulsos blancos uruguaios
voltariam a pegar em armas. Além disso, emissários paraguaios incitaram a
sedição entre as tropas irregulares formadas por Urquiza em Entre Ríos.
Urquiza, que havia recebido o comando da vanguarda aliada, voluntariou-se para
retornar à província e restaurar a ordem. Em vez disso, ele retornou ao seu
rancho, aumentou sua fortuna vendendo cavalos aos aliados, e as tropas
irregulares desertaram para suas fazendas e ranchos.
O
Coronel Estigarribia atravessou o Rio Uruguai e ocupou sucessivamente, de junho
a agosto, as povoações de São Borja, Itaqui e Uruguaiana. Os contatos com o
Major Duarte foram interrompidos pelo assédio de duas embarcações armadas
brasileiras, comandadas pelo Tenente Floriano Peixoto, e pelo pântano que os
separavam.
O
presidente uruguaio Flores decidiu atacar a menor das forças paraguaias. Em 17
de agosto, na batalha de Jataí, na margem direita do rio Uruguai, a coluna sob
as ordens do major Pedro Duarte, a qual pretendia chegar ao Uruguai, foi detida
por Flores.
Segunda fase: Contra-ataque
aliado (1865-66)
Em
16 de julho, o Exército Brasileiro chegou à fronteira do Rio Grande do Sul e
logo depois cercou Uruguaiana. A tropa recebeu reforços e enviou pelo menos
três intimações de rendição a Estigarribia. Em 11 de setembro Dom Pedro II
chegou ao local do cerco, onde já estavam os presidentes argentino Bartolomé
Mitre e uruguaio Venancio Flores, além de diversos líderes militares, como o
Almirante Tamandaré. As forças aliadas do cerco contavam então com 17346
combatentes, sendo 12393 brasileiros, 3802 argentinos e 1220 uruguaios, além de
54 canhões. A rendição veio em 16 de setembro quando Estigarribia entrou em
acordo em relação às condições exigidas.
Encerrava-se
com esse episódio a primeira fase da guerra, em que Solano López lançara sua
grande ofensiva nas operações de invasão da Argentina e do Brasil. No início de
outubro, as tropas paraguaias de ocupação em Corrientes receberam de López
ordem para retornar a suas bases em Humaitá. Nessa altura, as tropas aliadas
estavam-se reunindo sob o comando de Mitre no acampamento de Concórdia, na
província argentina de Entre Ríos, com o marechal-de-campo Manuel Luís Osório à
frente das tropas brasileiras. Parte destas deslocou-se para Uruguaiana, onde
foi reforçar o cerco a esta cidade pelo exército brasileiro no Rio Grande do Sul,
comandado pelo tenente-general Manuel Marques de Sousa, barão e depois Conde de
Porto Alegre. Os paraguaios renderam-se no dia 18 de Setembro de 1865.
Nos
meses seguintes, as tropas aliadas, com Mitre como comandante-em-chefe,
libertavam os últimos redutos paraguaios em território argentino, as cidades de
Corrientes e São Cosme, na confluência dos rios Rio Paraná e Paraguai, no final
de 1865. No fim do ano de 1865, a ofensiva era da Tríplice Aliança. Seus
exércitos já contavam mais de 50 mil homens e se preparavam para invadir o
Paraguai.
A invasão do Paraguai
Fortalecidos,
com um efetivo de cinquenta mil homens, os aliados lançaram-se à ofensiva. A
invasão do Paraguai iniciou-se subindo o curso do rio Paraguai, a partir do
Passo da Pátria. Sob o comando do general Manuel Luís Osório, e com o auxílio
da esquadra imperial, transpuseram o rio Paraná, em 16 de abril de 1866, e
conquistaram posição em território inimigo, em Passo da Pátria, uma semana
depois. De abril de 1866 a julho de 1868, as operações militares
concentraram-se na confluência dos rios Paraguai e Paraná, onde estavam os
principais pontos fortificados dos paraguaios. Durante mais de dois anos o
avanço dos invasores foi bloqueado naquela região, apesar das primeiras
vitórias da Tríplice Aliança.
A
primeira posição a ser tomada foi a Fortaleza de Itapiru. Após a batalha do
Passo da Pátria e a do Estero Bellaco (2 de maio), as forças aliadas acamparam
nos pântanos de Tuiuti, em 20 de maio, onde sofreram um ataque paraguaio quatro
dias depois. A primeira batalha de Tuiuti, a maior batalha campal da história
da América do Sul e uma das mais importantes e sangrentas do conflito, foi
vencida pelos aliados em 24 de Maio de 1866 e deixou um saldo de 10.000 mortos.
Por
motivos de saúde, em julho de 1866 Osório passou o comando do 1.º Corpo de
Exército brasileiro ao general Polidoro da Fonseca Quintanilha Jordão. Na mesma
época, chegava ao teatro de operações o 2.º Corpo de Exército, trazido do Rio
Grande do Sul pelo barão de Porto Alegre (10.000 homens).
O
caminho para Humaitá não fora desimpedido. O comandante Mitre aproveitou as
reservas de dez mil homens trazidos pelo barão de Porto Alegre e decidiu atacar
as baterias do Forte de Curuzú e do Forte de Curupaiti, que guarneciam a
direita da posição de Humaitá, às margens do rio Paraguai. A bateria de Curuzu
foi conquistada em 3 de setembro pelo barão de Porto Alegre. Não se obteve,
porém, o mesmo êxito em Curupaiti, que resistiu ao ataque de 20 mil argentinos
e brasileiros, guiados por Mitre e Porto Alegre, com apoio da esquadra do
almirante Tamandaré. Em 22 de setembro, os aliados foram dizimados pelo
inimigo: quase cinco mil homens morreram em poucas horas, na única vitória
defensiva paraguaia em toda campanha. Este ataque fracassado criou uma crise de
comando e deteve o avanço dos aliados.
Nessa
fase da guerra, destacaram-se muitos militares brasileiros. Entre eles, os
heróis de Tuiuti: o general José Luís Mena Barreto, o brigadeiro Antônio de
Sampaio, patrono da arma de infantaria do Exército brasileiro, o
tenente-coronel Emílio Luís Mallet, patrono da artilharia e o próprio Osório,
patrono da cavalaria, além do tenente-coronel João Carlos de Vilagrã Cabrita,
patrono da arma de engenharia, morto em Itapiru.
Terceira
fase: estagnação (1866-1868)
O
comando de Caxias
No
segundo período da guerra (1866-1869), os desentendimentos entre Osório
(comandante das forças brasileiras) e o presidente argentino, que se opunha às
perseguições aos paraguaios, levou o governo brasileiro a substituí-lo.
Designado em 10 de outubro de 1866 para o comando das forças brasileiras, o
marechal Luís Alves de Lima e Silva, marquês e, posteriormente, Duque de
Caxias. Assumiu suas funções em Tuiuti, em 19 de novembro, encontrando o
exército praticamente paralisado. Os contingentes argentinos e uruguaios vinham
sendo retirados aos poucos do exército dos aliados, assolado por epidemias.
Desentendimentos entre Venâncio Flores (Uruguai) e Mitre (Argentina) e
problemas internos fizeram ambos se retirarem do combate e voltarem a seus
países, deixando o Brasil praticamente sozinho. Tamandaré foi substituído no
comando da esquadra pelo almirante Joaquim José Inácio, futuro visconde de
Inhaúma. Paralelamente, Osório organizou um 3.º corpo de exército no Rio Grande
do Sul, com mais de cinco mil homens. Na ausência de Mitre, Caxias assume o
comando geral e providenciou a reestruturação do exército.
Entre
novembro de 1866 e julho de 1867, Caxias organizou um corpo de saúde (para dar
assistência aos inúmeros feridos e combater a epidemia de cólera-morbo) e um
sistema de abastecimento das tropas. Conseguiu também que a esquadra imperial,
que se ressentia do comando de Mitre, colaborasse nas manobras contra Humaitá.
Nesse período, as operações militares limitaram-se a escaramuças com os
paraguaios e a bombardeios da esquadra contra Curupaiti. López aproveitava a
desorganização do inimigo para reforçar suas fortificações em Humaitá.
Apesar
dos esforços de Caxias, os aliados só reiniciaram a ofensiva em 22 de julho de
1867. A marcha de flanco pela ala esquerda das fortificações paraguaias
constituía a base tática de Caxias: ultrapassar o reduto fortificado paraguaio,
cortar as ligações entre Assunção e Humaitá e submeter esta última a um cerco.
Com este fim, Caxias iniciou a marcha em direção a Tuiu-Cuê. Em 1º de agosto
Mitre retornou ao comando e insistia no ataque pela ala direita, que já se
mostrara desastroso em Curupaiti. Embora a manobra de Caxias tenha sido
bem-sucedida, o tempo decorrido possibilitou a López fortificar-se também nessa
região e fechar de vez o chamado Quadrilátero.
Quarta fase: os Aliados retomam a
ofensiva (1868-1869)
Tomada de Humaitá
Mitre
deu ordens para que a esquadra imperial forçasse a passagem em Curupaiti e
Humaitá. Em 15 de agosto, duas divisões de cinco encouraçados ultrapassaram,
sem perdas, Curupaiti, mas foram obrigadas a deter-se frente aos poderosos
canhões da fortaleza de Humaitá. O fato causou novas dissensões no alto comando
aliado. Mitre desejava que a esquadra prosseguisse. Os brasileiros, entretanto,
consideravam imprudente e inútil prosseguir, enquanto não se concatenassem
ataques terrestres para envolver o Quadrilátero, que se iniciaram, finalmente, em
18 de agosto.
A
partir de Tuiu-Cuê, os aliados rumaram para o norte e tomaram São Solano, Vila
do Pilar e Tayi, às margens do rio Paraguai, onde completaram o cerco da
fortaleza por terra e cortaram as comunicações fluviais entre Humaitá e
Assunção. Em 3 de novembro de 1867, como reação, López atacou a retaguarda da
posição aliada de Tuiuti. Nessa segunda batalha de Tuiuti, López esteve próximo
da vitória, mas, graças ao reforço trazido pelo general Porto Alegre, os
brasileiros venceram, com pesadas perdas.
Em
janeiro de 1868, com o afastamento definitivo de Mitre, que retornou à
Argentina, Caxias voltou a assumir o comando geral dos aliados. Em 19 de
fevereiro a esquadra imperial, capitão-de-mar-e-guerra Delfim Carlos de
Carvalho, depois barão da Passagem, forçou a passagem de Humaitá. Apesar os
navios encouraçados terem ultrapassado a fortaleza, chegando a bombardear
Assunção, só em 25 de julho de 1868 Humaitá, totalmente cercada, caiu após um
demorado cerco.
Dezembrada
Solano
López deixara Humaitá, com parte de suas tropas, em março, indo se instalar em
San Fernando. Ali descobriu que alguns funcionários de seu governo e seu irmão
Benigno tramavam derrubá-lo. Formado um conselho de guerra para julgar os
implicados, centenas foram executados, no que ficou conhecido como o massacre
de San Fernando.
Efetuada
a ocupação de Humaitá, as forças aliadas comandadas por Caxias marcharam 200 km
até Palmas, fronteiriça às novas fortificações inimigas (30 de setembro).
Situadas ao longo do arroio Piquissiri, essas fortificações barravam o caminho
para Assunção, apoiadas nas Fortificações de Lomas Valentinas. Ali, López havia
concentrado 18 mil paraguaios em uma linha fortificada que explorava habilmente
os acidentes do terreno e se apoiava nos fortes de Angostura e Itá-Ibaté.
Renunciando ao combate frontal, o comandante brasileiro idealizou, então, a
mais brilhante e ousada operação do conflito: a manobra do Piquissiri. Em 23
dias fez construir uma estrada de 11 km através do Chaco pantanoso que se
estendia pela margem direita do rio Paraguai, enquanto forças brasileiras e
argentinas encarregavam-se de diversões frente à linha do Piquissiri.
Executou-se então a manobra: três corpos do Exército brasileiro, com 23.000
homens, foram transportados pela esquadra imperial de Humaitá para a margem
direita do rio, percorreram a estrada do Chaco em direção ao nordeste, reembarcaram
em frente ao porto de Villeta, e desceram em terra no porto de Santo Antônio e
Ipané, novamente na margem esquerda, vinte quilômetros à retaguarda das linhas
fortificadas paraguaias do Piquissiri. López foi inteiramente surpreendido por
esse movimento, tamanha era sua confiança na impossibilidade de grandes
contingentes atravessarem o Chaco.
Na
noite de 5 de dezembro, as tropas brasileiras encontravam-se em terra e, em vez
de avançar para a capital, já desocupada pela população e bombardeada pela
esquadra, iniciaram no dia seguinte o movimento para o sul, conhecido como a
"dezembrada" - a série de vitórias obtidas por Caxias em dezembro de
1868. No mesmo dia 6, o general Bernardino Caballero tentou barrar-lhes a
passagem na ponte sobre o arroio Itororó. Na tomada da ponte de Itororó, Caxias
partiu a galope em direção ao inimigo, com espada em punho, exclamando:
"sigam-me os que forem brasileiros!". Vencida a batalha de Itororó, o
Exército brasileiro prosseguiu na marcha e aniquilou na Batalha de Avaí,
localidade de mesmo nome, em 11 de dezembro, as duas divisões de Caballero.
Em
21 de dezembro, tendo recebido o necessário abastecimento por Villeta, os
brasileiros atacaram o Piquissiri pela retaguarda e, após seis dias de combates
contínuos, conquistaram a posição de Lomas Valentinas, com o que obrigou a
guarnição de Angostura a render-se em 30 de dezembro. As batalhas da Dezembrada
exibiram espantosas mortandades dos dois lados, bem como tentativas de recuo das
tropas brasileiras, impedidas graças à presença de Caxias na linha de frente.
López, acompanhado apenas de alguns contingentes, fugiu para o norte, na
direção da cordilheira.
Após
destruir o exército paraguaio em Lomas Valentinas, Caxias acreditava que a
guerra tinha acabado. Não se preocupou em organizar e chefiar a perseguição de
López, pois parecia que o ditador fugia para se asilar em outro país e não,
como se viu depois, para improvisar um exército e continuar a resistir no
interior.
No
dia 24 de dezembro os três novos comandantes da Tríplice Aliança (Caxias, o
argentino Gelly y Obes e o uruguaio Enrique Castro) enviaram uma intimação a
Solano López para que se rendesse. Mas López recusou-se a ceder e, acompanhado
apenas de alguns contingentes, fugiu para o norte, na direção da cordilheira,
chegando a Cerro León.
O
comandante-em-chefe brasileiro se dirigiu para Asunción, evacuada pelos
paraguaios e ocupada em 1.º de janeiro de 1869 por tropas imperiais comandadas
pelo coronel Hermes Ernesto da Fonseca, pai do futuro Marechal Hermes da
Fonseca. No dia 5, Caxias entrou na cidade com o restante do exército e 13 dias
depois, por motivo de saúde, deixou o comando e regressou ao Brasil. A partida
de Caxias e de seus principais chefes militares fez crescer entre as tropas o
desânimo, com a multiplicação dos pedidos de dispensa dos oficiais e
voluntários.
Quinta fase: caça a Solano López
(1869-1870)
Fim da guerra: o comando do Conde
d'Eu
No
terceiro período da guerra (1869-1870), o genro do imperador Dom Pedro II, Luís
Filipe Gastão de Orléans, Conde d'Eu, foi nomeado para dirigir a fase final das
operações militares no Paraguai, pois buscava-se, além da derrota total do
Paraguai, o fortalecimento do Império Brasileiro. O marido da princesa Isabel
era um dos poucos membros da família imperial com experiência militar, já que
na década de 1850 participara, como oficial subalterno, da campanha espanhola
na Guerra do Marrocos. A indicação de um membro da família imperial pretendia
diminuir as dificuldades operacionais das forças brasileiras, problema agravado
pelos muitos anos de campanha, pela insatisfação dos veteranos e pelos conflitos,
políticos e pessoais, que se alastravam entre os oficiais mais experientes.
Em
agosto de 1869, a tríplice aliança instalou em Asunción um governo provisório
fantoche aliado de contrários a Solano, encabeçado pelo paraguaio Cirilo
Antonio Rivarola. O Império acelerou o processo para a formação do governo, que
prometerá realizar eleições democráticas no ano seguinte e criar uma assembleia
constituinte.
Solano
López, prosseguindo na resistência, refez um pequeno exército de 5000 homens, a
maioria velhos, crianças e veteranos semi-inválidos e 36 canhões na região
montanhosa de Ascurra-Caacupê-Peribebuí, aldeia que transformou em sua capital.
À frente de 12 mil homens, o conde d'Eu chefiou a campanha contra a resistência
paraguaia, a chamada Campanha das Cordilheiras, encerrada em 18 de agosto.
Principalmente
no Brasil, após os conservadores terem voltado ao poder no camará imperial, se
tornou prioridade a reconstrução do estado paraguaio. Para este ser
reconhecido, era necessário a vitória sobre Solano. O processo foi acelerado
pela entrada no governo argentino, em 1868, de Domingo Faustino Sarmiento,
cujos desejos expansionistas o Império do Brasil temia.[10]
O
exército brasileiro flanqueou as posições inimigas de Ascurra e venceu a
batalha de Peribebuí (12 de agosto), para onde López transferira sua capital.
Após a batalha de Peribuí, o Conde d'Eu parece ter-se exasperado com a
obstinação paraguaia em continuar a luta, nada fazendo para evitar a degola de
prisioneiros capturados durante e depois dos combates. Na batalha seguinte,
Campo Grande ou Nhu-Guaçu (16 de agosto), as forças brasileiras se defrontaram
com um exército formado, em sua maioria, por adolescentes e crianças e idosos,
recrutados a força pelo ditador paraguaio. A derrota paraguaia encerrou o ciclo
de batalhas da guerra. Os passos seguintes consistiram na mera caçada a López,
que abandonou Ascurra e, seguido por menos de trezentos homens, embrenhou-se
nas matas, marchando sempre para o norte.
Dois
destacamentos foram enviados em perseguição ao presidente paraguaio, que se
internara nas matas do norte do país acompanhado de 200 homens. No dia 1.º de
março de 1870, as tropas do general José Antônio Correia da Câmara (1824-1893),
o Visconde de Pelotas, surpreenderam o último acampamento paraguaio, em Cerro
Corá, onde Solano López foi ferido a lança pelo cabo Chico Diabo e depois
baleado, nas barrancas do arroio Aquidabanigui, após recusar-se à rendição.
Depois de Cerro Corá, as tropas brasileiras ficaram eufóricas, assassinando
civis, pondo fogo em acampamentos e matando feridos e doentes que se
encontravam nos ranchos.
Não
era esse o desejo do imperador D.Pedro II, que preferia ter López preso a
morto. No Rio de Janeiro, a morte de Lopéz foi muito bem recebida e o imperador
recuperou sua popularidade que havia sido abalada pela dispendiosa guerra. Em
20 de junho de 1870, Brasil e Paraguai assinaram um acordo preliminar de paz.
Consequências
Mortalidade
O
Paraguai sofreu grande redução em sua população. A guerra acentuou um
desequilíbrio entre a quantidade de homens. Algumas fontes citam que 75% da
população paraguaia teriam perecido ao final da Guerra.
Dos
cerca de 160 mil brasileiros que combateram na Guerra do Paraguai as melhores
estimativas apontam cerca de 50 mil óbitos e outros mil inválidos. Outros ainda
estimam que o número total de combatentes pode ter chegado a 400 mil, com
sessenta mil mortos em combate ou por doenças.
As
forças uruguaias contaram com quase 5.600 homens, dos quais pouco mais de 3.100
morreram durante a guerra devido às batalhas ou por doenças.
Já
a Argentina perdeu cerca de 18 mil combatentes dentre os quase 30 mil
envolvidos. Outros 12 mil civis morreram devido principalmente a doenças.
Fato
é que a Guerra do Paraguai não se diferenciou dos demais conflitos ocorridos
durante o século XIX. As altas taxas de mortalidade não foram decorrentes
somente por conta dos encontros armados. Doenças decorrentes da má alimentação
e péssimas condições de higiene parecem ter sido a causa da maior parte das
mortes. Entre os brasileiros, pelo menos metade das mortes tiveram como causa
doenças típicas de situações de guerra do século XIX. A principal causa mortis
durante a guerra parece ter sido o cólera.
Pós-guerra
Não
houve um tratado de paz em conjunto. Embora a guerra tenha terminado em março
de 1870, os acordos de paz não foram concluídos de imediato. As negociações
foram obstadas pela recusa argentina em reconhecer a independência paraguaia.
O
Brasil não aceitava as pretensões da Argentina sobre uma grande parte do Grande
Chaco, região paraguaia rica em quebracho (produto usado na industrialização do
couro). A questão de limites entre o Paraguai e a Argentina foi resolvida
através de longa negociação entre as partes. A única região sobre a qual não se
atingiu um consenso — a área entre o rio Verde e o braço principal do rio
Pilcomayo — foi arbitrada pelo presidente estado-unidense Rutherford Birchard
Hayes que a declarou paraguaia. O Brasil assinou um tratado de paz em separado
com o Paraguai, em 9 de janeiro de 1872, obtendo a liberdade de navegação no
rio Paraguai. Foram confirmadas as fronteiras reivindicadas pelo Brasil antes
da guerra. Estipulou-se também uma dívida de guerra que foi a primeira dívida
da história paraguaia e foi intencionalmente subdimensionada por parte do
governo imperial do Brasil mas que só foi efetivamente perdoada em 1943 por
Getúlio Vargas, em resposta a uma iniciativa idêntica da Argentina. O Paraguai
perdeu 90 mil quilômetros quadrados para o Brasil nos tratados de paz.
O
reconhecimento da independência do Paraguai pela Argentina só foi feito na
Conferência de Buenos Aires, em 1876, quando a paz foi estabelecida definitivamente.
Em
dezembro de 1975, quando os presidentes Ernesto Geisel e Alfredo Stroessner
assinaram em Assunção um Tratado de Amizade e Cooperação, o governo brasileiro
devolveu ao Paraguai troféus da guerra..
Conclusões
Resultados da guerra:
PARAGUAI: destruição do Estado existente,
perda de territórios vizinhos e ruína da economia paraguaia, de modo que mesmo
décadas depois, não conseguiu se desenvolver da mesma forma que os vizinhos.
Perdas na guerra: até 69% da população, a maioria devido a doenças, fome e
exaustão física.
BRASIL: a guerra expôs a fragilidade
militar-estrutural do Império, devido à escravidão, principalmente, mas saiu
vitorioso militarmente e fortaleceu sua hegemonia até 1875. Reflexos internos:
desequilíbrio orçamentário e no Tesouro brasileiro, além da forte dissociação
entre Exército e monarquia, devido ao sentimento de identidade que se construiu
durante a guerra. Perdas na guerra: 50 mil homens, devido a doenças e ao rigor
do clima.
O
tesouro real indicou um gasto de 614 mil contos de réis, provindos das
seguintes fontes:
Empréstimo
Estrangeiro: 49 (em milhares de contos de Réis)
Empréstimo
Interno: 27
Emissão
de dinheiro: 102
Emissão
de títulos: 171
Imposto:
265
O
conflito custou, pois, ao Brasil, quase onze anos do orçamento público anual,
em valores de pré-guerra, o que permite compreender melhor o persistente
"déficit" público nas décadas de 1870 e 1880. Também chama a atenção,
nos números sobre as fontes dos recursos gastos na luta, a participação
proporcionalmente pequena de empréstimos externos.
O
Brasil levou à guerra em torno de 139 mil homens, de um total de pouco mais de
9 milhões de habitantes, ou seja, cerca de 1.5% da população. A origem
conhecida dos efetivos, sem incluir os efetivos da Marinha, foram:
Voluntários
da Pátria: 54.992
Guarda
Nacional: 59.669
Recrutamento
e Escravos Libertos: 8.489
Total:
123.148
ARGENTINA: passou por inúmeras rebeliões
federalistas contra o governo nacional, pelo descontentamento com a guerra;
economicamente foi beneficiada, pois abasteceu as tropas brasileiras com
produtos (principalmente carne e cereais) oriundos de Buenos Aires, mas também
houve sangria do Tesouro nacional. A guerra contribuiu para a consolidação do
Estado nacional argentino e para dinamizar sua economia. Perdas na guerra: 30
mil homens.
URUGUAI: sofreu impactos menores. Perdas
na guerra: 5.000 soldados.
Alterações
no plano regional: a guerra de certa forma substituiu a histórica rivalidade
entre Argentina e Brasil pela cooperação entre os dois grandes países, uma
aliança estratégica duradoura, embora as desconfianças entre os lados continuem
até hoje. Durante todo o tempo da campanha, as províncias de Entre Rios e
Corrientes abasteceram as tropas brasileiras com gado, gêneros alimentícios e
outros produtos. Economicamente, os mais beneficiados foram os comerciantes
argentinos durante a guerra.
O
Brasil, que sustentou praticamente sozinho a guerra, pagou um preço alto pela
vitória. Durante os cinco anos de lutas, as despesas do Império chegaram ao
dobro de sua receita, provocando uma crise financeira. A escravidão passou a
ser questionada, pois os escravos que lutaram pelo Brasil permaneceram
escravos.
O
Exército Brasileiro passou a ser uma força nova e expressiva dentro da vida
nacional. Transformara-se numa instituição forte que, com a guerra, ganhara
tradições e coesão interna e representaria um papel significativo no
desenvolvimento posterior da história do país. Além disso, houve a formação de
um inquietante espírito corporativista no exército, que futuramente, formaria a
República Federativa do Brasil.